Ponto para D'Amatore

Alguma questão? Perguntou D’Amadore à plateia boquiaberta.

Mãos participativas levantaram-se de vários pontos do auditório. Os olhos treinados do consultor imediatamente passaram a informação ao seu cérebro, neurolinguisticamente programado que, rapidamente processou a situação e organizou a vez dos consultantes por ordem de possíveis clientes. Assim, o primeiro a ser atendido foi o quase CEO de uma recém privatizada.

Com um movimento de cabeça e um gesto elegante como de um bailarino deu a palavra ao prospect que polemizou: Se me permite,eu, com todo respeito, discordo do seu ponto de vista., começou o competitivo jovem, como implantar sua proposta motivacional sem a verticalização sistemática do organograma de decisão, ou, em outras palavras, como não comprometer a horizontalidade das atitutes estratégicas da organização?

A pergunta era relativamente simples, responde-la seria como tirar doce de criança, entretanto, a experiência recomendava prudência, poderia estar diante de uma inteligência rara, consultores muito mais bem sucedidos do que ele já tinham caído na armadilha da facilidade. Acostumado a enxergar as oportunidades através das adversidades. Reconheceu que, aqui e agora, estava diante da chance de afirmar suas competências e conquistar, quem sabe? Mais um cliente. Daria um show, decidiu, enquanto colocava o notebook para dormir fechando o PowerPoint.

Muito bem, André, sua pergunta é bastante oportuna, começou o eloqüente palestrante, e não sei bem ao certo o motivo, mas ela me fez lembrar uma história que ouvi durante um seminário sobre, Perspicácia em Decisões Corporativas em Yale, no ano passado, no evento - Eficiência Tática versus Eficácia Estratégica: um Desafio para o Novo Milênio. Esse congresso, como vocês devem ter ouvido falar, reuniu grandes nomes do conhecimento empresarial mundial e foi durante uma palestra de uma dessas grandes autoridades, cujo nome não me vem à memória no momento, ato falho que de forma alguma diminui o seu brilhantismo. Pois bem, esse ilustre congressista nos presenteou com a seguinte narrativa.

Havia um rei muito bom e sábio que governava seu país com honestidade justiça e abnegação, coisa rara hoje em dia. A platéia riu do comentário, estava indo bem, pensou. Então prosseguiu. Por mais que se empenhasse e exigisse de seus ministros e colaboradores a mesma atitude, o reino não prosperava.. Existia paz, era verdade. Todos trabalhavam muito, acordavam cedo e trabalhavam: os da terra arando e colhendo. Os da guerra conquistando e defendendo. E os sábios - e o reino os tinha em quantidade - vivendo e aprendendo. E mesmo assim o reino não prosperava: a colheita era pouca, as conquistas ilusórias e o conhecimento inútil.

Um dia, o monarca cansou-se daquela entediante história que ele estava escrevendo para o seu país e resolveu chutar o balde real. Antes ser lembrado como O Louco que como O Bundão, concluiu.

Apesar da clareza que a decisão transformadora deu à sua mente, o seu primeiro ato dentro desse novo paradigma foi um tanto óbvio: Convoquem todos os sábios à minha presença. A platéia riu novamente. Ponto para D'Amadore, anotou e continuou imediatamente para não desconcentrar-se.

E os sábios vieram à presença do rei e foi-lhes feita solenemente uma única pergunta: como tornar o nosso reino uma terra de prosperidade?

E as repostas vieram aos milhares e de formas diferentes: metáforas, parábolas, aforismos, citações, enigmas, profecias e maldições.

O rei ouvia a todas com atenção, não perguntava a nenhum conselheiro sobre a acertividade da resposta, apenas ouvia o seu predestinado coração real que continuava batendo triste sem ser tocado por nenhuma.

Então o último sábio entrou no palácio. A tarde caia e as poucas velas acessas - medidas de racionamento - deixavam o ambiente ainda mais dramático.

Entrou na sala da audiência com mais humildade do que todos os outros que o antecederam e saudou o rei com respeito.
Cansado o rei fez pela milésima vez a mesma pergunta.
E o último sábio, cuja sombra se projetava alongada pelo recinto, sabiamente respondeu: não tenho a menor idéia, majestade.

D' Amatore então concluiu: acho que respondi a sua pergunta. A platéia aplaudiu arrebatada.

Ao sair o quase CEO despediu-se e deixou seu cartão. Bingo!

Maio 2001
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