Déjà vu

“Dois industriais se encontram. O primeiro pergunta ao segundo: Sua publicidade é eficaz?
Sem dúvida alguma - responde este – Por exemplo: outro dia colocamos um pequeno anúncio para encontrar um vigia noturno e, na mesma noite, fomos assaltados.

De maneira simplesmente caricatural, esta história ilustra bastante bem os resultados de alguns trabalhos recentes; nem sempre a publicidade produz os efeitos esperados. Em compensação, ela produz outros que, por vezes, os próprios anunciantes não esperavam”.

Apesar da atualidade da piada, o trecho acima abre um livrinho meio antigo mas interessante: Os Mitos da Publicidade publicado no Brasil em 74 pela Vozes. O livro parece ser uma seleção de ensaios da revista “Communications”, pelo menos é isso que se deduz do subtítulo da capa.

Nos anos 70 comunicação virou um pouco moda e de repente começaram a pipocar livros de assuntos como semiótica, linguística, mitologias, assuntos não muito fáceis de entender mas obrigatórios de se carregar para estar - usando uma expressão da época: inserido no contexto. Os novos cursos de comunicação tinham enfim a cara pop para atrair uma geração a procura de, perdoem o trocadilho, “significado”.

Mas vejam só, nesse outro trecho, como mesmo há 30 anos a validade do investimento em propaganda já era maldosamente questionado: “Talvez não exista nenhum outro ramo dos negócios que apresente tão poucas justificações do emprego dos recursos que lhe concedemos”, a declaracão é de 1969 e foi feita pelo vice-presidente da Coca-Cola no Estados Unidos, McNiven.

Em outro capítulo nos deparamos com um parágrafo que bem poderia ter chegado através de um e-news agorinha: “Se observamos o que se passa no estrangeiro, mas também entre nós, há alguns anos, a publicidade direta parece, de forma evidente destinada a um futuro mais brilhante que o da publicidade geral. Cada vez mais os clientes (Industriais, comerciais, vendedores de produtos ou serviços) exigirão resultados palpáveis para orçamentos de publicidade cada vez mais elevados. Ora, precisamente nos Estados Unidos, as grandes agências estão em crise. Os orçamentos de publicidade orientam-se, cada vez mais para fornecedores rentáveis, cuja remuneração se faz por honorários e não através de comissão (certos orçamentos comportam 35 de honorários, outros 18%)”.

Incrível é quase três décadas depois pouco ter mudado nessa paisagem: o marketing direto continua com seu futuro cor-de-rosa enquanto as agências de propaganda agonizam impotentes em seus leitos de morte. Morte lenta, por sinal.

É evidente que muita água passou por baixo da ponte deste os anos setenta. O mercado é hoje muito melhor compreendido do que há 30 anos. Tudo modernizou-se fantasticamente, mas principamente cresceu a demanda por informação, viabilizada pela tecnologia e estimulada, obviamente, pela natureza competitiva do mercado.

No entanto, paradoxalmente, mesmo com um retrato muito mais nítido e detalhado à disposição, ainda assim, com freqüência, assistimos à recorrentes aberrações estratégicas. Como numa tragédia grega, os oráculos são também inexplicavelmente ignorados ou mal interpretados. O final todos conhecem.
Filosofando um pouco, se me permitem a pretenção, parece-me que além do alívio e da purgação, as tragédias pretendiam proporcionar também alguma aprendizagem, do mesmo modo deveria ocorrer com a história, para não tornar-se um insosso déjà vu.

Por isso, nesse século onde tudo parece tão novo e inédito, parece oportuno, pra encerrar, incluir um sarcástico parágrafo do começo da moderna era publicitária, escrito em 1959 por um tal de Martineau, numa obra citada no velho livrinho.

“Em nossos dias, nenhum industrial procederia para fabricar seus produtos, da mesma maneira como alguns deles elaboram suas estratégias comerciais e publicitárias. Ele não misturaria jamais um pouco de óleo, de álcool, de doce de framboesa e alguns pregos, esperando que daí surgisse alguma coisa.”

Fevereiro de 2003
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