All along the watchtower.

Outubro de 2006

Enquanto a idéia não vem, a atenção se dirige para o som: "There must be some kind of way out of here, said the joker to the thief".

Mais de 30 anos depois da sua morte – por afogamento no próprio vômito, como determinava o destino rock n' roll dos grandes artistas daquela era - Hendrix continua apavorando, do vinil ao iPod.

Ninguém é obrigado a gostar, mas imaginem como seriam insuportáveis as noites em que buscamos a grande idéia sem um sonzinho pra segurar? Ou, o que é bem mais comum, como seria sinistro cumprir os prazos apenas na companhia monótona da ventoinha do computador?

Pois a música, meus caros, é o único barato que nos sobrou nesta nossa época certinha, politicamente correta e socialmente hipócrita, na qual se permite que boeings entrem em prédios, sem serem anunciados, mas não se admite um cigarrinho no local de trabalho.

Em compensação, porque sempre existe uma compensacão, a tecnologia nunca nos forneceu tantas formas de acesso ao nosso som preferido. E que são largamente usadas enquanto damos conta dos nossos jobs diários.

Mas não é de hoje que a rapaziada da criação curte uma música para animar a festa. Embora soe nostálgico, com o perdão do trocadilho, saibam os meninos de iPod que até o prosáico radinho de pilha já ocupou seu lugar no departamento. A qualidade, obviamente, nem se compara. Por outro lado, a cola daquele tempo era muito mais alucinante.

Hoje, com a quantidade de músicas disponíveis e com a oferta de players, incluindo o computador, é até possível criar sound designs específícos para cada job. Mixar sets para concorrências. Produzir trilhas próprias para madrugadas. Enfim, nossas noites podem ter a qualidade sonora dos melhores Clubs de Londres, dos estúdios de Los Angeles ou do show dos Stones. E, graças aos fones de ouvido, às tardes podemos fugir para bem longe da agência que é onde, normalmente, se escondem as boas idéias.

Com todas essas facilidades à disposição, atualmente cada um projeta o som do seu dia ou da sua noite de acordo com o seu produtor interno. Ele sabe, como ninguém, escolher a música mais apropriada à circunstância. Com a sensibilidade de um DJ que consegue manter a atmosfera sempre legal na pista, tem à mão dezenas de gêneros e milhares de títulos: rock de todos os pesos, blues, trip hop, deep house, MPB, acid jazz, blue grass, country, clássica, reggae, R&B, samba, techno, soul, sertaneja, funk e assim vai.

E se nos dermos ao trabalho de observarmos a fundo o quanto cada job tem a ver com essa intuitiva escolha vamos descobir que esse é um exercício tão divertido quanto inútil. Ou seja, vale a pena.

O fato é que hoje, como num filme, nossas vidas precisam ininterrupitamente de trilhas sonoras para afirmar, quem sabe, a nossa própria individualidade. Através das nossas escolhas musicais nos tornamos, num certo sentido, audiência de nós mesmos e com isso nos distinguimos da multidão.

O fone acaba por nos separar do ruído exterior no seu sentido mais amplo e simbólco. Isolando-nos do enjoativo caos em que se transformou o mundo. Em contado com a macia fluidez do mundo dos sons temos pelo menos a sensação de que conseguimos manifestar nossa natureza humana.

A questão é: quando clicamos play estamos no controle ou estamos nos deixando controlar? Afinal, a idéia sempre foi essa. Dane-se, nunca funcionou mesmo.

Play.
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