"Reticências não são bem-vindas."

Pontos de exclamação, apenas quando a gramática exigir e a revisão fechar questão.
Por outro lado, pequenos erros de digitação e barbaridades oriundas do primário mal feito, serão tolerados. Já erros de concordância, embora ninguém seja obrigado a concordar, não serão considerados erros e sim divergências sintáticas de opinião.
Depois eu continuo. (bem que cabia reticências)

Autor: Johan Holmdahal - 1942 report







A mulher e a metade.

Há 100 anos, 15 mil mulheres, segundo o portal do IWD - International Women’s Day, marcharam pela cidade de Nova Iorque exigindo a redução da jornada de trabalho, melhores salários e direito ao voto. Essa manifestação, foi o marco que deu origem ao Dia Internacional da Mulher.

Embora, durante todo esse tempo, a comemoração tenha existido no mundo em datas um pouco diferentes, foi apenas quando a ONU declarou 1975 como Ano Internacional da Mulher, que o dia 8 de março passou a ser reconhecido e celebrado globalmente. Desde então, não se parou mais de discutir as grandes questões que envolvem a mulher.

Mesmo assim, até hoje, o feminino em seu sentido biológico, simbólico e cultural, ainda representa a metade que permanece nas sombras da sociedade que, às vezes, parece bem-intencionada, mas que tem acertado tão pouco.

Integrar a natureza feminina ao sistema talvez seja a única forma de curá-lo em profundidade. Mas para isso, é preciso que a mulher seja incorporada não apenas ao mercado produtivo, tornado-se apenas mais uma consumidora bem sucedida, mas também a todas as estruturas organizadoras desse sistema.

O feminino precisa permear as leis, a administração, a religião, a pedagogia e a matemática. Deve estar no asfalto, nas máquinas, nos chips e na informação. Tem que celebrar a missa e a criação. E essa integração começa a partir da própria mulher, que deve enxergar além das suas conquistas, reconhecendo as hábeis manobras de um sistema que se alimenta das suas próprias contradições. Mas felizmente, nesse campo, elas são mestras.

Geração Olivetto.

A geração cinquentona não serviu em nenhuma Grande Guerra e só acompanhou os seus horrores nos documentários tendenciosos dos vencedores e na coleção do Readers Digest do avô - guardada com outros souvenirs da revolução de 30. Mesmo assim, em matéria de vivência histórica, os tiozões não têm do que queixar-se. Na mesma década do assassinato de um presidente americano, a sua geração acompanhou à conquista da lua. E, ainda adolescente, testemunhou o bombardeio de napalm nas aldeias vietnamitas. Em seguida, teve um professor comunista de verdade, ouviu falar de paus-de-arara, e ficou sabendo de amigos presos. Alguns tornaram-se lendas e letras de música, outros apenas desapareceram na névoa esquizofênica.

Ainda nessa época, teve o privilégio de assistir à única seleção brasileira digna desse nome. Sobreviveu à meningite, à colera, à cuba libre, aos vinhos nacionais e as drogas importadas - a mesma sorte não tiveram seus idolos mais radicais, afogados no próprio vômito. Não sucumbiu à dezenas de hits de verão, ao cinema nacional, ao teatro engajado e a outras manifestações pós-modernas. E quando começou a procurar estágio visitou a Proeme, a Toni, a Deck,a Publitec, a Progresse a Denison.

Nunca teve absoluta segurança quanto à sua escolha profissional. Afinal, as suas primeiras experiências com a linguagem publicitária não eram muito estimulantes: rigorosamente às nove da noite, na TV Tupy, entrava aquele comercial do Cobertores Paraíba, lembrando que já era hora de dormir. Felizmente os seus pais, mais liberais, concediam uma meia horinha de prorrogação, tempo suficiente para assistir ao comercial de fim de ano da Varig ou, no inverno, das Casas Pernambucanas.

"Mais vale um bronze na parede que um ouro na gaveta."

Prêmios, prêmios, prêmios. Já não é difícil bastante ter idéias? Não é suficientemente gratificante, ver um trabalho produzido e veiculdo?

Entretanto, o prestígio na diretoria, a vaga privilegiada no estacionamento e o reconhecimento do mercado nada significam se não puderem ser materializados num certificado, estátua, diploma ou algo que possamos desdenhar com legítima falsa modéstia.

Angel of the morning.

Julho de 2003

Não tem como negar, existe um dial implantado na alma de cada paulistano. Portanto, falar sobre rádio é uma coisa quase que natural pra gente. Dando-se, é claro, um desconto para os brancos da memória. Por isso, algumas sensações não encontram datas nem nomes no emaranhado da vida.

Acho que o primeiro neurônio que fritei, com generosas doses de rum barato, foi o do bibliotecário: aquele que organiza, cataloga, põe data, essas coisas. Em seguida perdi mais alguns bons por aí, outros foram ficando gordos por falta de exercício.

Mas, acredito que os sobreviventes dão conta da tarefa. Charutinho, personagem de Adoniran Barbosa. O Trabuco, programa de Vicente Leporace. Música na Veia, do Zuza Homem de Melo. Jornal da Manhã, Patrulha Bandeirantes, Concerto do Meio Dia. Reale Junior, Maurício Kubrusli, Fiore Gigliote, Osmar Santos. Eldorado, Jovem Pan, Bandeirantes, Record, Difusora, Excelsior.

Esses, e muitos outros, personagens, locutores, programas e estações me amamentaram radiofônicamente pela vida, digamos assim. Não estou citando as músicas, pois a lista seria muito grande e, pior, óbvia. Já grandinho, tenho que confessar, que devo muito às programações noturnas. Seguramente, não teria sobrevivido a tantas madrugadas de trabalho em claro sem um radinho para apoiar. Era sempre igual: invariavelmente havia uma hora em que a consciência da impossibilidade de cumprir a tarefa invadia o ambiente. O tempo deixava de fluir, às quinze para as três, os segundos ficavam licorosos como mel, os olhos ardidos não se arriscavam a piscar. Eu ficava preso para sempre no inferno da urgência. Acorrentado à eternidade da noite. Sufocado no ar espesso das impossibilidades. Porém, quando tudo parecia irremediavelmente perdido, do surrado radiogravador surgia uma luz salvadora. A introdução instrumental prenunciava a bonança. A voz de Merilee Rush começava doce: "There'll be no strings to bind your hands/ Not if my love can bind your heart".

Aos poucos minha alma ia sendo resgatada da danação, mesmo sendo roqueiro radical, era obrigado a render-me à salvação, vinha o refrão redentor: "Just call me angel of the morning, angel/ Just touch my cheek before you leave me oh baby/Just call me angel of the morning, angel" E, então, o tempo voltava a passar, existia uma pequena chance de dar certo, de dar tempo. De volta ao trabalho.

Não saberia enumerar quantas vezes passei por experiências desse tipo mas, com algumas variações, a situação era basicamente a mesma: primeiro o desespero a seguir a companheira redenção do rádio. Às vezes fanhosa, algumas bem baixinho, pra não acordar o filho pequeno. Outras muito alto, pra espantar os fantasmas.

Blaupunkt.

Outubro de 2003

Tinha uma época em que se identificava o tipo pelo toca-fitas de gaveta que carregava nas salas de espera dos cinemas e nas esperas dos restaurantes. Suponho que até mesmo nos quartos de motel. Era geralmente uma pessoa comum, fisicamente quero dizer, às vezes meio fortinho, de vez em quando ossudo. Claro que havia também os gordos e magros, mas eram exceção.

Não seria um totalmente inadequado chamá-lo de babaca, mas em tempos politicamente corretos melhor denominá-lo de: portador compulsivo de toca-fitas de gaveta ou PCTG. Esse comportamento estranho tinha, evidentemente, como toda piração, uma justificativa racional bem razoável: se deixado no carro a maravilha tecnológica fatalmente seria imediatamente farejada e atacada pelos abutres urbanos que, já naquele idos, infestavam as ruas de São Paulo.

E, além do prejuízo provocado pela perda do som, ainda corria-se o risco de ter o vidro da Brasuca (Brasília) quebrado, se o serviço não fosse feito por um profissional qualificado. Havia caras que mesmo quando guardavam seus Milequina (Volkswagen sedan 1500, o saudoso Fuscão) em estacionamentos retiravam os toca-fitas alegando que os manobristas podiam mexer no som, o que era o cúmulo do comportamento invasivo. É claro que tinha também o lado exibicionista do cara, que carregava o som como um crachá para mostrar para todo mundo a gravidade de sua doença. Nem é preciso dizer que ao seu lado havia uma namorada igualmente comprometida espiritualmente - namorada não, esses tipos nunca tinham namorada: era sempre noiva.

Psicologicamente, não saberia dizer em que fase do desenvolvimento esse estranho comportamento poderia remeter. Seria o exótico fetiche, um substituto do seio materno uma chupeta transitorizada, resíduo comportamental da fase oral não resovida? Quem sabe, uma fraldinha eletrônica de estimação? Nessa época meu carro tinha um som tão desgraçado que me fariam enorme favor se o roubassem, embora a perda afetiva fosse irreparável. Por isso, não posso deixar de considerar que esses comentários possam conter algumas distorções provocadas por um certa inveja.

Chamar o velho rádio Blaupunkt de som seria um exagero. Uma vez que, as ondas que os alto-falantes lançavam ao ar - se é que a mistura de nicotina, gasolina e outras fumaças pudesse ser considerada ar –, fundiam-se com as vibrações da lateral da porta esquerda, reverberavam na molinha do porta luvas, entravam em fase com um coral de arruelas, parafusos, latas, pinos, mancais, tuchos, guarnições e reparos, transformando cada música numa sinfonia única. Os hits da época eram acompanhados por uma sensacional cozinha percusiva. Levada não apenas pelos graves dos alto-falantes, como também pelos amortecedores vencidos, maltratados pelas irregularidades da esfarrapada camada asfáltica que revestia as ruas.

Tudo isso, sem contar com as interferências dos buracos de verdade que, quebravam o ritmo dando um colorido todo urbano e moderno ao concerto. Agora, espetáculo mesmo é quando chovia e o limpador de pará-brisas fazia sua participação especial na avenida. Nota dez em harmonia. Possuia um swing inigualável. E na sua evolução ruidosa pelo asfalto molhado, esparramava alegre o confete prateado das gotas de chuva. Ao subir, no sentido anti-horário, dava uma paradinha que com o tempo se tornava hipnótica, tanto pelo movimento, quanto pelo som que produzia.

Na volta, quando a palheta do lado do motorista alinhava-se em 90°, a oposta já estava uns dez graus à frente e despencava rapidamente, produzindo um apitinho muito próximo do inaudível, um show. Só vendo. Então começava um novo compasso, no tempo forte como tem que ser. Detalhe, não podia mudar de estação. Não é que não desse certo. É que havia uma, acho que posso chamar assim, sintonia fina para minha estação favorita que requeria uma certa concentração. Era como tentar descobrir o segredo de um cofre: precisava pegar no botão do dial com carinho e ir girando de um lado para o outro até o som ficar cristalino. Uma operação que não dava para fazer, por exemplo, com o carro em movimento. Às vezes levava um tempo. Isso não seria um grande problema se o carro não fosse o lugar mais apropriado pra se iniciar novos relacionamentos. E também, se o rádio não fosse, apesar de meia boca, a coisa mais importante que existia naqueles tempos. "E não é que todas as mina tinham as manha de mexer na porra do rádio. Caralho!"

O mesmo de sempre.

Janeiro de 2008

A imprensa especializada tem noticiado que deveremos manter, em 2008, uma taxa de crescimento semelhante a do ano passado. A partir desse balanço positivo, nos lançamos rumo ao ano novo com os doces ventos do otimismo enfunando as velas rotas e remendadas deste sofrido mercado. E partimos, mais uma vez, por mares nunca dantes navegados, invocando as malcheirosas ninfas do Belém, em busca da inspiração necessária para produzirmos idéias capazes de cruzar o Atlântico e fazer bonito em Cannes.

Sendo um pouco menos épico, se atravessarmos o ano com os clientes na casa, os salários depositados em dia e os jobs entregues no prazo, já está de bom tamanho. Se incluídos na Archive, short list em Nova Iorque ou Londres, melhor ainda. Nem é preciso citar o Colunistas e o Clube de Criação do Paraná, porque neles temos o dever de premiar. Porém espetacular mesmo seria entrar no anúário do Clube de Criação de São Paulo.

2008 - Ano do rato no horoscópo Chinês, olímpico em Pequim, bisexto no calendário gregoriano, regido por Marte na astrologia e Ogum no candomblé. Em 2008, não trabalharemos tanto em feriados, uma vez que os dias da Independêcia, Nossa Senhora de Aparecida, Finados e Proclamação da República caeam no sábado ou domingo. Nos finais de semana, entretando, haverá expediente normal nas agências.

Pensando bem, não há muito o que dizer sobre um ano que mal começou, é sempre a mesma conversa. Falando nisso, até o Carnaval 2008 vai colaborar com nosso enredo otimista, caindo na primeira semana de fevereiro. Segundo os economistas, isso antecipa a retonada dos negócios. O verão mais curto, embora possa perturbar ações sazonais, faz como que o ano econômico começe mais cedo. Difícil é engolir essa tese em um país com mais de sete mil quilómetros de costa, mas sempre pega bem um pouco de sisudez engravatada no meio dessa luxuriante nudez tropical que é o verão brasileiro.

A imprensa também destaca os jogos de Pequim como alavancador das verbas publicitárias a índices olímpicos, para nossas pastelarias regionais não acredito que os jogos forneçam nada a mais que alguns bons motes para o varejo. Por outro lado, as eleições municipais vão chegar em boa hora, acrescentando sempre uma verba a mais aos bolos regionais. E novamente a estrela, em termos de crescimento projetado para 2008, será a internet, que deve representar cerca de 4,5% de toda a verba publicitária, segundo estudo do IAB Brasil. Finalmente, só o fato de começarmos o ano sem a CPMF já produz aquela sensação boa de que, de repente, pode dar certo.

Acho que é isso. Previsões e tendências, o mesmo de sempre. Espero que ao menos tenha sido chato o suficiente para motivar alguém a escrever sobre algum assunto mais interesante.

All along the watchtower.

Outubro de 2006

Enquanto a idéia não vem, a atenção se dirige para o som: "There must be some kind of way out of here, said the joker to the thief".

Mais de 30 anos depois da sua morte – por afogamento no próprio vômito, como determinava o destino rock n' roll dos grandes artistas daquela era - Hendrix continua apavorando, do vinil ao iPod.

Ninguém é obrigado a gostar, mas imaginem como seriam insuportáveis as noites em que buscamos a grande idéia sem um sonzinho pra segurar? Ou, o que é bem mais comum, como seria sinistro cumprir os prazos apenas na companhia monótona da ventoinha do computador?

Pois a música, meus caros, é o único barato que nos sobrou nesta nossa época certinha, politicamente correta e socialmente hipócrita, na qual se permite que boeings entrem em prédios, sem serem anunciados, mas não se admite um cigarrinho no local de trabalho.

Em compensação, porque sempre existe uma compensacão, a tecnologia nunca nos forneceu tantas formas de acesso ao nosso som preferido. E que são largamente usadas enquanto damos conta dos nossos jobs diários.

Mas não é de hoje que a rapaziada da criação curte uma música para animar a festa. Embora soe nostálgico, com o perdão do trocadilho, saibam os meninos de iPod que até o prosáico radinho de pilha já ocupou seu lugar no departamento. A qualidade, obviamente, nem se compara. Por outro lado, a cola daquele tempo era muito mais alucinante.

Hoje, com a quantidade de músicas disponíveis e com a oferta de players, incluindo o computador, é até possível criar sound designs específícos para cada job. Mixar sets para concorrências. Produzir trilhas próprias para madrugadas. Enfim, nossas noites podem ter a qualidade sonora dos melhores Clubs de Londres, dos estúdios de Los Angeles ou do show dos Stones. E, graças aos fones de ouvido, às tardes podemos fugir para bem longe da agência que é onde, normalmente, se escondem as boas idéias.

Com todas essas facilidades à disposição, atualmente cada um projeta o som do seu dia ou da sua noite de acordo com o seu produtor interno. Ele sabe, como ninguém, escolher a música mais apropriada à circunstância. Com a sensibilidade de um DJ que consegue manter a atmosfera sempre legal na pista, tem à mão dezenas de gêneros e milhares de títulos: rock de todos os pesos, blues, trip hop, deep house, MPB, acid jazz, blue grass, country, clássica, reggae, R&B, samba, techno, soul, sertaneja, funk e assim vai.

E se nos dermos ao trabalho de observarmos a fundo o quanto cada job tem a ver com essa intuitiva escolha vamos descobir que esse é um exercício tão divertido quanto inútil. Ou seja, vale a pena.

O fato é que hoje, como num filme, nossas vidas precisam ininterrupitamente de trilhas sonoras para afirmar, quem sabe, a nossa própria individualidade. Através das nossas escolhas musicais nos tornamos, num certo sentido, audiência de nós mesmos e com isso nos distinguimos da multidão.

O fone acaba por nos separar do ruído exterior no seu sentido mais amplo e simbólco. Isolando-nos do enjoativo caos em que se transformou o mundo. Em contado com a macia fluidez do mundo dos sons temos pelo menos a sensação de que conseguimos manifestar nossa natureza humana.

A questão é: quando clicamos play estamos no controle ou estamos nos deixando controlar? Afinal, a idéia sempre foi essa. Dane-se, nunca funcionou mesmo.

Play.

O tema é bom

Fevereiro de 2006


Há alguns dias, que a essa altura já devem ser semanas, o mercado foi surpreendido por uma manchete curiosa que afirmava que a Ficher acabava da abolir o atendimento da sua operação.

Sendo um pouquinho maldoso, dá até para imaginar o pessoal da criação, em festa, fazendo bundalelê para a humilhada equipe de atendimeto. Ao ler a matéria, entretanto, percebe-se que a alegria da criação durou pouco. “O padrão proposto pela Ficher, continua o texto, é abolir o atendimento passando essa tarefa diretamente para as equipes de planejamento e criação.” Acabou-se a farra, ainda bem que a criação, acostumada a apagar incêndios, consegue extinguir a tempo a fogueirinha alimentada pelos jobs mais urgentes. Prosseguindo, o texto esclarece: “os profissionais do atendimento passarão a compor um núcleo de operações, que ajudarão no gerenciamento das contas no dia-a-dia.” Ou seja, a marcação, no bom sentido, continuará sendo na saída de bola.

Brincadeira à parte, é sempre produtivo quando alguém tenta alguma coisa diferente na operação das agências, de repente dá certo e todo o mercado acaba ganhando com a nova proposta. Notícia já deu. Piadas, com certeza, também vão aparecer. Afinal o tema é bom: Aí, o cliente liga para a agência e pede: Por favor, me passe para o atendimento. Sinto muito senhor - a telefonista responde -, aqui na agência não existe atendimento. Puxa, pensei que só eu é que tinha notado - responde o cliente. Mais uma: Será que quando a criação for jantar com um cliente vai pedir pizza?

Mas, no final, quem vai aprovar ou não a mudança é o onipotente “mercado” - essa entidade colérica e temperamental a quem todas as nossas estranhas decisões são submetidas.

E o que virá depois da agência sem atendimento? Será que surgirá a agência sem criação? Bem, temos que admitir, que essas já existem aos montes. Da mesma forma, as sem-vergonha também não são novidade, mesmo antes do teatro das CPIs.

Seguindo essa tendência de simplificação radical da operação, o formato mais perfeito a que se pode chegar é, sem dúvida, o da agência sem clientes. Modelo dos sonhos no qual a criação poderá se manifestar em toda a sua plenitude: criando para quem bem entender, sem a pressão dos prazos nem as restrições dos briefings. A mídia dispondo de quantos GRPs forem precisos para uma cobertura ideal. E o planejamento colecionando cases e mais cases para as marcas mais interessantes do mercado e, é claro, para a própria agência.

Nessa nova estrutura, a agência será remunerada apenas por resultados. Isso, entretando, não deve dificultar o seu desempenho uma vez que não havendo nenhum diretor de marketing, gerente de produto ou esposa de presidente pondo o dedo no trabalho, o risco será praticamente nulo. Deve-se ter apenas o cuidado ético de comunicar as empresas quando uma nova campanha irá ao ar, para que haja tempo de organizar a produção, distribuição e outros detalhes com os quais os clientes tanto se preocupam. Fica a critério da agência apresentar ou não o trabalho para o marketing da companhia. No entando, a agência se compromete a produzir e enviar o material de ponto de venda para que a empresa otimize seus resultados, bem como a permitir que o representante da marca acompanhe a agência nas cerimônias de premiações que possam vir em decorrência da campanha.

Assim, no ocaso do capitalismo, a propaganda viverá novamente a sua era de glória e a única falta sinceramente sentida será a do atendimento, extinto lá pelos idos de 2006. Nessa época de ouro, contudo, não faltará o reconhecimento da história a esses incansáveis profissionais sem os quais a propaganda nunca teria atingido o seu mais alto nível.


Salário fantasma

Dezembro de 2005

Há muito tempo, na época em que propaganda dava mais dinheiro que prestígio, no estúdio do Sérgio Jorge havia um cartaz com o título: “ESPECIALIDADE DA CASA.” em Franklin Gothic, aplicado à foto de um imponente e roliço pepino. Talvez esteja lá até hoje, perdido entre tripés, fundos e rebatedores.

A agência vizinha ao estúdio fazia mais o estilo clean com grandes quadros abstratos na parede. No entando, não era raro encontrar nos departamentos de criação avisos e posteres bem humorados alusivos a aspectos, às vezes, sombrios da profissão, como o de uma agência em São Paulo, citada pelo Beto Vivas: “MANTENHA O PÂNICO.” Ou um outro, se não me engano, na Lintas: “PROIBIDA A ENTRADA DE CACHORROS E CONTATOS.”

Da mesma forma, surgiam as expressões cunhadas na descontração das happy hours ou no suplício das madrugadas, que passavam a fazer parte do vocabulário, digamos, técnico da profissão. “ESSE ANDA COM CANUDINHO NO BOLSO”, por exemplo, acho que ainda hoje é usado para identificar aquele profissional que não passa por nenhuma crise de consciência ou conflito de valores ao cometer os plágios mais descarados. Na época, muito mais díficeis de serem identificados, porque a cultura publicitária não era tão uniformizada e difundida como hoje em dia. Teve até quem desenvolveu uma certa metodologia pessoal para “chupar” idéias bastante segura. Existia, inclusive, quem defendesse abertamente a felação intelectual alegando que se nós, subdeselvolvidos, copiavamos a moda, os produtos, os processos industriais e as tendências artísticas, por que esse pudor com a propaganda? Área, culturalmente, muito menos relevante e na qual os gringos eram muito melhores do que a gente. Não justificava mas, temos que admitir, havia bastan e consistência na argumentação.

Outra fórmula bastante usada, na construção desses conceitos, era adaptar um ditado ou frase bem conhecida para o contexto da propaganda: “CLIENTE É TUDO IGUAL, SÓ MUDA DE AGÊNCIA.” “JOB BOM É JOB MORTO.”

E havia nos estúdios avisos, surpreendentemente, bem-humorados para quem trabalhava dezoito horas por dia numa atmosfera impregnada de cola de sapateiro. Pensando bem, talvez fosse por isso: “PEDIDOS PRA ONTEM, SÓ AMANHÃ.” “QUEM MANDOU NÃO ESTUDAR?”

Mas nem tudo era inteligência e bom humor nas agências, de vez em quando surgiam umas coisas do tipo: “PENSE NO CLIENTE” Escrito em várias línguas que era medonho. Também tinha um cartaz bem-intencionado, mas de gosto pra lá de incerto que era o “IDEA KILLER” – uma ilustração de uma espécie de dragão, malvadão, circundada pela relação de não sei quantas maneiras de se matar uma idéia.

Mas esse tempo passou. Com o material gráfico mais acessível e a chegada, primeiro, das máquinas de xerox nos estúdios e depois dos computadores, os avisos e posteres foram se tornando mais descartáveis e pontuais, pois agora podiam ser substituídos a toda hora. Além disso, com a digitalização da propaganda, os estúdios e mesmo a criação perderam o seu look underground - mixto de oficina mecânica com atelier de costura - para se tornarem mais próximas de um comportado escritório de contabilidade.

O que de forma nenhuma dimimuiu a produção de magníficos aforismos sobre a profissão e que todo dia transitam pelos e-mails, reuniões, apresentações, palestras, conversas de boteco e por outros foruns informais.

Por exemplo, sobre as frustrações que as limitações locais provocam, não existe nada mais representativo que o ferino, já corrente, “ISSO NÃO É MERCADO, É QUITANDA.”

Acredito que do mesmo autor seja a "W/GAVETA", que indica o lugar para onde vão as boas idéias rejeitadas no dia-a-dia das agências.

Da mesma forma, já está incorporado o “COM QI NORMAL FiCA DIFICIL”, desabafo provocado pelo extenuante martírio de se criar algo mais bacana do que a média.

E, mais recente, tem a maravilhosa definição, talvez um pouco exagerada, da decadência ética e profissional que aflige a propaganda:
"HOJE EM DIA, ATÉ O SALÁRIO É FANTASMA."

PS. Não estou certo sobre a autoria das frases citadas nesse texto, nem do interesse dos seus autores em assumir publicamente seus enunciados bastardos. Diante disso, optei por omitir os nomes dos suspeitos.

Fuzileiro durma com o seu fuzil

Novembro de 2005

No último dia cinco, a convite do CCPR, esteve conversando com a gente o Dulcídio Caldeira. Desnecessário apresentá-lo a esse mercado que tanto foi marcado pelo seu trabalho. Acho oportuno, no entanto, destacar que a sua apresentação foi muito legal. Seu rolo corajoso, criativo e estimulante, ainda incluiu uma boa parte de comerciais produzidos localmente e que sobrevivem, apesar do tempo, sustentados apenas pelo brilho das suas idéias.

Logo no início do evento, depois de contextualizar o começo da sua carreira, Dulcídio apresentou seus primeiros filmes e começou a contar uma passagem antiga que, segundo ele, orientou o seu caminho como redator.

Aconteceu, mais ou menos, assim: no começo dos anos noventa, Dulcídio vai pela primeira vez a Cannes assistir ao Lions. Chegando lá, seus neurônios são expostos a um nível de radiação criativa ao qual não estava acostumado. Meio atordoado, naquele ambiente saturado de egos e idéias, Caldeira reconhece um de seus ídolos, Tom McElligott, um dos maiores profissionais de criação de todos os tempos. Mesmo sem dispor de óleo de peroba, tão necessário nessas ocasiões, Dulcídio o aborda com a cara-de-pau lustrada apenas pela vontade de aprender. Apresenta-se e implora, educadamente, por um encontro com o mestre. Deixa o telefone do hotel onde está hospedado e fica aguardando, ansioso, pelo resultado da extração do destino. Era o seu dia de sorte, o mestre liga e agenda um café para a manhã seguinte.

A conversa foi amigável e direta. No fundo, o que Dulcidio queria saber, era como se tornar um grande redator. Haveria uma fórmula, um método?
Gentilmente e sem muitos rodeios, McElligott começou a lembrar que quando serviu aos Estados Unidos como fuzileiro, o sargento tinha uma frase que resumia bem a intensidade do treinamento: “Fuzileiro, durma com seu fuzil,” dizia ele.

Quando, mais tarde, Tom decidiu tornar-se um grande redator, logo percebeu que a coisa não era assim tão simples. Perception - Reality - por mais que tentasse não conseguia fazer nada razoável. Foi quando pareceu ouvir a voz rouca do maldito sargento: “Fuzileiro, durma com seu fuzil.” A resposta veio automática: “Sir, yes sir!”

Assim, adotou o treinamento dos fuzileiros na sua nova frente de batalha, ou seja, passou a dormir com a máquina de escrever.
Porém, também nessa fase, foi preciso rastejar, vencer o sono, o cansaço e submeter-se à disciplina rigorosa. Assim, dia após dia, foram devorados anuários, rasgados incontáveis roteiros, formulados infinitos conceitos e descartadas montanhas de idéias. Até que, um belo dia – depois de quatro anos de treinamento -, seus tiros começaram a atingir o alvo. Cada vez mais e em intervalos menores…

Elegantemente, McElligott encerrou sua narrativa por aí, até porque a partir desse ponto, além de conhecida, a história se tornaria muito autocontemplativa. Despediram-se com cortesia e retornaram à maratona do festival.

A gente não esquece

Janeiro de 2004

O sonho já tinha acabado no fim dos anos 70. Ainda assim, toda uma geração pôde delirar com um comercial da Ellus em que um casal tirava a roupa e beijava-se em baixo d’água ao som de Rita Lee: “Meu bem você me dá água na boca/ Vestindo fantasias, tirando a roupa…”

É bom relembrar que lady Lee, apesar de estar entrando numa fase totalmente apaixonada e inofensiva, era melhor representante da ameaça elétrica, sensual e cabeluda do rock’n roll. Na época o rock ainda não era bem visto, talvez porque remetesse a uma forma irreverente de liberdade, pelo comprimento dos cabelos ou porque o pessoal tinha posteres do Che Gue Vara , no quarto quem sabe?

O fato é que essa combinação foi nitroglicerina pura explodindo no seio das tradicionais famílias brasileiras que, livres da ameaça comunista, viviam o clima morno pós-milagre.

Não tenho documentação segura a respeito, muito menos memória de elefante, mas parece que o comercial foi tirado do ar pela justiça, ou pelo menos houve essa tentativa. No entanto, lembro de assistir, pela TV, aos eloquentes apelos de Alex Periscinotto contra o filme, em nome dos bons costumes da época.

Desde então, muito comercial passou pelo break do Jornal Nacional. Até que, um certo dia, em 87 entrou no ar um filme que mostrava uma adolescente numa aula de educação física, constrangida, observando suas colegas que já usavam soutien. Ao chegar em casa encontra em sua cama um presentinho, adivinhem? Um legítimo Valisère. A criação foi da Camila Franco e Rose Ferraz, quem dirigiu foi o Julio Xavier.

Não sei se simultâneamente surgiu a visão masculina sobre o mesmo briefing. O filme de Nizan Guanaes, então na W/GGK, foi dirigido pelo mesmo Júlio Xavier; mostrava um garotinho que escalava uma janela para observar o vestiário feminino. A expressão de deslumbramento do moleque virou também um inesquecível outdoor: O primeiro Valisère a gente nunca esquece. Estava consagrado o mote.

Eram outros dias, mais liberais, vivia-se o clima da Assembléia Constituinte, naufragava o inesquecível Plano Cruzado e eramos conduzidos pelo letrado José Ribamar Ferreira de Araujo Costa: o inesquecível Zé Sarney.

Mas o tempo não parou, duzentas e poucas edições da Cláudia depois, todo mundo acompanhou a polêmica, de alto nível, por sinal, entre a Wondebra e a Valisère por conta de um anúncio que fez referência a memorável campanha de da Valisère de 87. As peças da Wondebra afirmavam: “O primeiro soutien a gente…Hi. Esqueci”.

Uma discussão que teve um final pra lá de feliz: a W/Brasil recuperou a conta da Valisère e a Wondebra obteve uma exposição na mídia muito maior do que a campanha teria, não houvesse despertado o lado Senhoras de Santana dos meninos da W/ Brasil - “na luta sempre necessária pela manutenção de padrões éticos na comunicação publicitária e preservação da cultura popular brasileira”.
Em outros tempos, esse mesmo pessoal ficaria indignado é com as reticências no título. Tudo muda.

Como era esperado, ninguém no mercado saiu em defesa da Z+, nem eles mesmos. Imaginem o redator então, deve ter comido o pão que o diabo amassou. Em briga de elefante quem sai pisado é a grama, meu irmão.

De qualquer forma, uma dispuda entre soutiens só é boa quando os dois lados ganham.
Não sei porque me lembrei de outra música da Rita Lee, se não me engano é do disco Entradas e Bandeiras, aqui vai um trechinho:

“Vou dar trabalho à crítica
Já que ela depende de mim
É um jeito de sair do buraco que é fundo
E acaba-se o mundo por falta de imaginação
Eu não!
Meu departamento é de criação!”

É, tem coisa que a gente não esquece.

Prêmios, muitos prêmios

Dezembro de 2003

Não há quem não se pergunte de vez em quando: o que estou fazendo aqui? Os mais inquietos já se levantam perturbados com a questão. Dependendo do estado geral da companhia, a dúvida pode assumir dimensões existenciais extremas, levando a pessoa ao desespero.

A situação tende a agravar-se quando, ao olhar para baixo, o outrora assanhado pinguelo encontrar-se eclipsado por uma proeminência abdominal que o condena ao esquecido mundo das sombras.

E essa questão vai ganhando urgência na medida em que o tempo vai diminuindo, matematicamente, nossas possibilidades e invertendo algumas prioridades. Afinal, de que adianta ficar rico depois de perder a juventude ou, a mocidade, quer dizer, a maturidade?

Bem, eu vou deixar a fortuna para o ano que vem, mas não por desistência, por absoluta falta de tempo. Assim como a pousada. E outros projetos secretos.

Quem sabe, o ano que vem, o convite milionário bata à sua porta: Nisan a bordo de um vôo que teve origem em Curitiba apanha uma Gazeta do Povo redobrada bem nos classificados de automóveis. Mesmo um pouco sonolento, é atraído pelo leiaute do 6x18 que se destaca da poluição gráfica da página.

Um décimo de milésimo de segundo depois, é nocauteado pela genialidade do título. Procura pela assinatura da agência no canto do anúncio (viu como é importante assinar todos anúncios?), a viagem a Curitiba já valeu a pena, pensa. Nem se lembra mais o que veio fazer na cidade, seu faro profissional acaba de descobir mais dois novos talentos.

Então você revoltado com o computador obsoleto - que o financeiro insiste em dizer que: pra redator está mais que bom - de repente recebe uma ligação. A recepcionista anuncia: tem um tal de Nizão, Nição, alguma coisa assim, pra você. Você conclui: só está no emprego porque é gostosinha, deve ser sacanagem de alguém, suspeita. Quase que você é engando pelo sotaque bahiano. Não, não pode ser. Será?

Confesso que mesmo para as sutilezas criativas do destino, esse é um roteiro meio improvável. No entanto, há dois anos, quem diria que o PT faria um presidente e, mais surpreendente, que mesmo assim pouca coisa mudaria na nossa vida e muito menos na vida dos humildes. E menos ainda na rotina dos poderosos.

Toda época é boa pra pirar, mas a mistura de Chester, tender, peru, pernil abacaxi, uva, panetone, passas, farofa doce, farofa salgada, arroz, lentilha, nozes, castanhas, figos, pêssegos, avelãs, cerveja, champagne, whiskey, vinho tinto, branco, seco, suave, rose, frizante, coca cola, fanta uva, guaraná Antártica, garaná Bhrama, vodka - de repente, até uma cachacinha de barrica pra não negar a origem humilde - e um licorzinho, por que não?

Tudo isso deve provocar uma intoxicação alucinógena, semelhante ao Peiote ou ao Santo Daime, que afasta a alma da nostagia e das contradições depressivas dessas Festas nos elevando às esferas mais inconseqüentes: onde o delírio é normal e o insólito esperado.

Dois mil e quatro, lá vamos nós sobre nossas pernas, mantidos em pé pelos fios mágicos dos sonhos que sustentam nossas cabeças mais altas que os ombros.
Guiados pela voz muda da natureza e todas essas coisas que a gente fala nessa época.

Bons negócios, grandes sonhos, prêmios, muitos prêmios a todos.

As pessoas gostam

Novembro de 2003

“Toda empresa deve desenvolver uma filosofia de comportamento socialmente ético e responsável, conforme o conceito de marketing social, todo gerente deve ir além do aspecto legal e desenvolver padrões baseados em integrideade pessoal, consciência corporativa e bem estar do consumidor a longo prazo. Uma filosofia clara e responsável irá auxiliá-lo a lidar com as várias questões intrincadas propostas e por outras atividades humanas”.

Quem saberia dizer de onde foi estraído esse parágrafo?

A) De uma palestra de Oded Grajew;
B) Da coluna do Gilberto Dimenstein;
C) De um livro de Phillip Kotler;
D) Da missão da Natura.
E) De uma entrevista de Anita Roddick

Vamos ao resultado: o parágrafo foi estraído do livro Princípios de Marketing de Philip Kotler e Gary Armstrong - LTC - Rio de Janeiro - 1999.
Por isso, quem respondeu alternativa C, parabéns. Você é dos poucos que lêem antes de sair citando e, mais ainda, até o fim. Afinal, a citação foi retirada da página 483 da obra que possuí 526 páginas. Se descontarmos o glossário e o índice, sobram 506. Portanto, na pior das hipóteses, você já pode ser incluído no seletíssimo grupo dos profissionais de marketing com boa formação teórica.

Infelizmente, hoje em dia, isso não significa uma “vantagem competitiva” muito importante, embora possa ser um diferencial interessante numa situação acadêmica.

Se você não acertou, não tem a menor importância. Porque, na verdade, a afirmação poderia partir de qualquer um dos listados. Uma vez que esse tema está incluído, pelo menos no discurso, na agenda de quase todas as empresas e entidades, preocupadas em desenvolver relações comerciais capazes de gerar maior lucro social. Ou pelo menos não causar prejuízos nessa área.

Mas essa brincadeira é só um pretexto pra abordar uma questão que, às vezes, incomoda nesses tempos politicamente corretos e um tanto hipócritas: como um posicionamento social pode conviver com a estética da propaganda?

Vejam só, Curitiba está implantando um mobiliário urbano que possuí um espaço para publicidade, superlegal. Agora se preenchermos esses espaços com materiais horríveis a cidade vai ficar um terror. Se veicularmos peças bacanas, Curitiba fica mais bonita. Isso não significa que devemos criar uma espécie de comissão julgadora municipal para eleger os materiais veiculáveis sob o ponto de vista estético. Por outro lado, é uma boa hora de se perguntar: será que não temos nada a ver com isso?

Em qualquer capital se discute muito sobre a poluição visual que a propaganda produz. No entanto, de nada adianta regulamentar placas e normatizar espaços se eles forem preenchidos com lixo visual e pobreza cultural. A desculpa é sempre a mesma: tem que chamar atenção. Ou então: as pessoas gostam. Se gostam, então por que reclamam tanto da poluição visual?

Nas mensagens dirigidas às classes C e D as justificativas tornam-se mais bizarras. Somos levados a seguir padrões estéticos que foram estabelecidos para elas, sob o argumento de que esse público não entenderia uma linguagem esteticamente requintada. Identificando-se apenas com um repertório pobre, de clichês de gosto duvidoso.

Dentro desse raciocínio, uma professora de Educação Artística de uma escola pública deveria fixar seus objetivos em que referencial? O da propaganda? Se o mundo funcionasse assim, os meninos da classe D não sonhariam com os Nike da classe A. E os jogadores de futebol, de origem simples, ao serem conduzidos à fama e fortuna, não comprariam carros posicionados para classes mais privilegiadas.

É verdade que só por pertencer à lista de compras da classe A, um produto torna-se, quase que automaticamente, alvo do desejo dos segmentos com menor poder de compra. Mas ninguém nunca investigou se comunicação segmentada para a classe A faria sucesso nas classes C e D.

Diante dessas questões, parece que o conceito de responsabilidade social poderia, muito bem, orientar também os aspectos formais da publicidade. Afinal, um anúcio ruim é visualmente poluente, psicologicamente indigesto e socialmente nocivo.

Simplesmente taxar a propaganda de irresponsalidade social seria, sem dúvida, uma simplificação espiatória ingenua e perigosa. Uma vez que ela é mais reflexo do que causa das contradições sociais. Por outro lado, agir como se não tivessemos nada a ver com a questão é assumir a alienação como postura. O que é, no mínimo, antiprofissional.

Novembro de 2003

Monólogo sobre Platão

Monólogo sobre Platão

Quem está começando agora - e não é filho de cliente - deve estar enfrentando algumas dificuldades para ingressar no deslumbrante mundo da propaganda. A propósito, sempre é bom lembrar que ainda dá pra mudar de idéia. Afinal, um médico na família é muito mais útil do que um publicitário. Advogado então, nem se fala. Os engenheiros depois das primeiras ferrovias sobre a Serra do Mar, nunca mais perderam o prestígio, nada mais justo.

O chato é que, nessa profissão, mesmo depois de vencer todas as barreiras iniciais, em vez do merecido reconhecimento, ainda leva-se a fama de espertalhão e engador, os atributos mais representativos da atividade – o que não quer dizer que sejam verdadeiros. “Bem, onde há fumaça há fogo”, dizem nssos detratores.

Logo aprende-se que nas reuniões sociais, que não sejam do meio, é melhor não apresentar-se como publicitário, se não vem uma enxurrada de comentários, às vezes embaraçosos, sobre aquele comercial medonho mas que as pessoas adoram. Tentar convencer do contrário pode ser ainda mais arriscado. Porque brasileiro além de técnico de futebol por natureza, economista por necessidade, especialista em automobilismo por paixão, também é crítico de propaganda por não ter mais o que fazer.

Não bastassem essas situações, ainda tem sempre aquele revoltado que nos trata com um desprezo só aplicável aos estupradores e pedófilos. Não tente argumentar, nem procure um assunto conciliatório: ele não torce para o seu time, saiu no meio do filme que você citou e simplesmente desconhece a sua banda favorita. Provavelmente a preferência sexual é diferente da sua, mas isso é o de menos hoje em dia.

Regra número um: a publicidade é indefensável diante de qualquer platéia que não seja formada por publicitários. Até o Petit que não é bobo nem nada, quase se complicou num debate no fim do século passado com o Oliviero Toscani ao tentar defender a propaganda, lembram-se? Bastava tê-lo chamado de colega.

Mas se pensarmos bem, é natural que isso aconteça, porque propaganda é tudo o que veicula comercialmente: do varejo mais sem-vergonha à mensagem do Ministério da Saúde estimulando o uso de camisinha. De uma lâmina mentirosa que corta tudo, até uma sofisticada campanha de um jipinho de U$70 mil. E uma vez que tem muito mais propaganda ruim que boa no ar, é inevitável que carapuça acabe servindo em todos nós.

Pelo que realizou até agora, nossa “era da propaganda” não deverá ser lembrada nem como a mais feliz, nem como a mais justa e muito menos como a mais bonita, apesar de empregar milhares de maravilhosos talentos de todas as áreas.

É pena que o padrão qualitativo apresentado nos festivais fique restrito a uma parcela pequena de anunciantes e agências, freqüentadores de quase todos os short lists do mundo. Que bom que pudesse ser o nivelador do mercado. Infelizmente, o juri popular, aquele que vai ao super-mercado e efetivamente paga o salário, continua tendo os mesmos hábitos que o mercado espera que tenha. Até porque, é triste admitir, propaganda medíocre também vende, e com vantagens: é mais fácil de fazer, de medir e de justificar através da história. Sobretudo, parece ser menos arriscado fazer o que todo mundo faz, do que o que ninguém fez. “Diferenciar ou Morrer” foi um bom título para fazer da obra de Jack Trout um best-seller, mas não o suficiente para mudar a comunicação da maioria da empresas. Diante disso, por que tentar fazer boa propaganda então?

Podemos especular um monte nesse terreno, no entanto, as explicações de natureza filosófica parecem ser mais apropriadas para justificar essa questão do que as estritamente mercadológicas.
No fundo a boa propaganda – no que se refere a sua forma - fundamenta-se muito mais na ética do que nos dados científicos da pesquisa de mercado. David Olgilvy recomendou no seu clássico Confissões de um Publicitário: “Nunca escreva um anúncio que você não quereria que a sua família lesse.” É bem verdade que ele estava falando sobre a honestidade do conteúdo. Mas esse raciocínio bem que é aplicável ao bom gosto e a originalidade.

Trazendo para o nosso mundinho vaidoso: Jamais faça um anúncio que envergonharia você diante dos seus coleguinhas. Afinal, mais que uma reputação, temos um ego a zelar. Quando as urgências de mercado começam a validar qualquer coisa, é bom que pelo menos o nosso trabalho deixe claro que não temos nada a ver com isso.

Hoje em dia, quem sabe seja possível referendar mercadologicamente a feiura. Eticamente porém, não existe justificativa para o grosseiro e o vulgar. Bem sei que isso tudo pode parecer meio platônico. Porque na verdade é.

Novembro de 2003

Coração de estudante

Há dois anos, movido mais por motivação pessoal do que por exigência do mercado, - sem desconsiderar todo o esforço de marketing das escolas, bem como as facilidades que hoje se apresentam para quem quer continuar seu aprendizado - me matriculei em um curso de especialização.

Para meu espanto ao entregar a xerox de meu diploma de graduação, no ato da matrícula, pude constatar como meu tempo de estudante tinha ficado distante. Que tipo de escola me esperava?

Nesse intervalo, minha profissão se transformou mais de uma vez. Algumas atividades ligadas a ela praticamente foram extintas. Outras mudaram tanto, que quando contamos aos mais novos como eram os processos do passado, eles nos observam com ar de total incredulidade.

É verdade que, por sorte ou azar, nossa geração pode assistir a mais transformações do que o resto da humanidade em toda sua história. Mesmo assim em qualquer época, vinte anos são vinte anos. Estava curioso diante da volta à escola.

Para minha decepção, logo percebi que tirando o laboratório de informática e as aulas apresentadas sobre PowerPoints, elaborados mais como um mostruário de efeitos do que como um apoio à aula, muito pouco havia mudado na vida acadêmica.

Como nos meus bons tempos, persistia ainda uma rotina baseada em procetimentos burocráticos que, como há vinte anos, se sobrepunham ao essencial, ou seja, à produção de conhecimento. Mas essa é uma visão muito pessoal. Produto, quem sabe, das minhas experiências um tanto frustrantes do tempo de estudante.

Tentando enxergar além do meu plano pessoal, acredito, no entando, que a minha experiência não seja assim tão particular e reflete a realidade, ainda que distorcida, da universidade brasileira.

Essa senilidade da produção acadêmica nacional, foi admitida recentemente pelo Ministro Cristovam Buarque como uma conseqüência da incapacidade da universidade de “acompanhar a velocidade do conhecimento científico e tecnológico de hoje.”

Essa constatação do ministro aponta para dois cenários diferentes, um trágico outro intrigante. O trágico é que a universidade brasileira têm, cada vez mais, uma deficiência qualitativa em relação a outros países. O lado curioso é que mesmo em outras partes do mundo, grande parte do o conhecimento está sendo produzido fora dos campi.

Outro ponto importante, muito discutido hoje em dia, se refere a efemeridade do conhecimento nos dias atuais. Questão que novamente bifurca-se em leituras opostas. Numa interpretação se não ingênua pelo menos otimista, essa questão mostra um mundo cor-de-rosa em constante aprendizado e aperfeiçoamento. Todavia, ao se confrontar essa visão com fatos divulgados pela imprensa no começo desse ano ano, que noticiaram a intenção da instalação de instituições de educação estrangeiras apoiadas pela OMC (Organização Mundial do Comércio), esse cenário torna-se mais coerente com o perverso “consenso de Washington”, do que com um mundo de oportunidades mais ou menos iguais.

É só observar a poderosa indústria que se formou em torno do ensino, do treinamento e do desenvolvimento pessoal. Amparada e justificada pela necessidade, discutível, de inserir a qualquer custo as sociedades nos critérios competitivos do mercado globalizado. Hoje, o estudante e o profissional, de qualquer área, estão encurralados entre um empregador, que exige formação constante e uma indústria de ensino que promete essa qualificação em troca de parte substancial do seu capital.

Não bastasse essa gula de lucros, compreensível num pais com tanto por realizar no campo empresarial, a oferta de empregos é mantida em níveis críticos porque mantém os salários baixos, o consumo mediocre e a inflação sob controle. Nas empresas a competividade individual é estimulada não apenas para aumentar a produtividade, mas para desestimular as negociacões coletivas. É o jeito Brasileiro de participar da economia globalizada.

Me parece inevitável que, ao longo da sua história, a universidade tenha padecido das mesmas doenças e contraído os mesmos vícios que corroeram a saúde ética, moral e financeira do nosso mal alfabetizado país. Tornando-a incapaz de desempenhar o seu papel com a eficiência mercadológica que os novos tempos exigem.

Nunca se apostou na escola, a não ser como investimento político de curto prazo. Ou como oportunidade de negócio, justificada pelas deficiências da estrutura de ensino. Ingenuidade minha, separar a universidade do mundinho maroto da política e da ética volúvel do empresário ou, numa linguagem mais acadêmica, do seu contexto histórico.

Enquanto o Brasil seguir em seu rumo cambaleante do ponto de vista ético, político e econômico. Enquanto não equacionarmos nossos problemas sociais de forma mais sincera e duradoura, a universidade não atingirá, sozinha, seu objetivo. Por outro lado, se não assumir o seu papel no mundo tal qual ele se apresenta, com as suas carências e injustiças, livrando-se da crônica acomodação burocrática, a universidade estará barrando não apenas o seu próprio desenvolvimento mas de todo o país.

Pronto, já me sinto estudante novamente.

Agosto de 2003

Tá mal pra todo mundo

Há alguns anos, numa discussão sobre a estratégia de uma agência de Curitiba, chegou-se a seguinte conclusão: era impossível viabilizar empresarialmente uma agência no mercado paranaense, sem as contas do governo. Na época, essa conclusão encaixava-se perfeitamente no cenário econômico em que vivivamos. Hoje, serve como luva.

Atualmente, assistimos a uma fase, no mínimo, curiosa no que diz respeito às contas de propaganda do governo. É bom deixar claro, que a qualidade das minhas informações não é melhor que a da maioria dos motoristas de taxi sem, é evidente, a sua sabedoria - adquirida nas páginas pragmáticas do asfalto. Portanto, vamos pular as análises pretenciosas e as minúcias venenosas de bastidores.

Dá inveja do Olivetto que viabilizou a W/Brasil sem um tostão oficial. Do Júlio Ribeiro, com a Talent, que, além disso, ainda recusou-se a atenter contas de cigarro e bebidas alcoólicas. Ou, das centenas de outras agências que vão seguindo, muito bem, sem o viabilizador aporte de capital chapa branca.
Inveja deles, do seu mercado ou do seu talento empresarial? Pouco importa, talvez um pouco de cada. A invenja, no terreno corporativo, não é pecado, ao contrário. Que seria de nós sem os benchmarks e os bons exemplos. Sem os gurus e seus cases, para serem comentados, estudados e seguidos? Ou apenas invejados.

Mesmo assim, todos os anos, lamentavelmente, assistimos a bons projetos serem moídos pela roda implacável da inércia conjuntural. De bares temáticos a agências de propaganda, passando pelas indústrias de tecnologia até os movimentos artísticos.

O capítulo dois do Marketing para o Século XXI, de Kotler, possui a seguinte epígarfe: “Uma grande ilusão é crer que se pode industrializar um país construindo fábricas. Impossível. Industrializar um país é construir mercados”. Paul G. Hoffman.

E mercado, é um conceito que pressupõe, obviamente, um volume ou uma quantidade de transações comerciais ao longo do tempo. Assim, o seu potencial depende fundamentalmente da vontade de cada um de fazer a roda, ainda que enferrujada e um tanto quadrada, girar.

A chamada demanda, que é o combustível de todos os mercados, é definida pelo Aurélio como “a disposição de comprar determinada mercadoria ou serviço, por parte dos consumidores”. Por estranho que pareça, não tem a ver apenas com o dinheiro, embora dependa dele. Ou seja, é estado de espírito, é humor, é temperamento.

Nesse sentido, o ditado: dinheiro não traz felicidade, também se aplica muito bem aos mercados. É por isso, que quando um minístro dá uma declaração infeliz ou acontece alguma encrenca mundial, o mercado empaca como jumento. Pois nenhuma emoção é mais paralizante do que o medo. Medo de investir, de ser despedido, de arriscar, de endividar-se. Medos mais que justificados, na pele pra lá de escaldada do brasileiro.

Mas o medo não só paraliza, como também brutaliza as relações de mercado. No pega-pra-capar, as parcerias são definidas em função de vantagens imediatas e vampirescas.

É por isso que, quando o anunciante conduz a relação comercial para uma espécie de humilhação profissional e a agência não só aceita, como repassa essa conduta aos seus colaboradores, não estamos construíndo mercados.
Da mesma forma, quando essa iniciativa parte das próprias agências, achando que podem recuperar amanhã a concessão feita hoje, não estamos construindo coisa alguma.

Ou, quando o veículo, por alguma razão comercialmente injustificável, esquece o papel intermediador da agência. Fazendo com que a atividade da empresa de propaganda seja confundida, aos olhos do anunciante, com a de um simples corretor remunerado por comissões questionáveis. Certamente, não se está construindo mercado.

Produtoras, gráficas, fotolitos, fotógrafos, enfim, todos aqueles que compõem o Gran Circo de la Comunicación Paranaense, todos têm dar uma mão na hora de levantar o pau e esticar a lona para o espetáculo. Já tem gente demais querendo ver o circo pegar fogo.

Práticas predatórias sempre existiram, o perigo está no momento em que começamos a chamá-las, resignadamente, de “novas regras” e a explicá-las como frutos de uma economia baseada na competitividade, na eterna crise ou na falta de grana.

Mas o baixo-astral não atinge apenas o mercado paranaense, se é que serve de consolo. No entanto, existe uma diferença fundamental, que pode ser ilustrada por um breve encontro com um diretor de arte paranaense que está tralhando em São Paulo e veio, no fim de semana, matar a saudade do friozinho. Na ocasião, não contive a clássica pergunta: e lá como é que tá? Tive que engolir a resposta. “Tá mal, pra todo mundo. Só que lá, os caras são mais profissionais”.

Setembro de 2003

Fama e sucesso

Recentemente em palestra realizada na Câmera Americana de Comércio em São Paulo, Al Ries causou polêmica no meio publicitário ao afirmar que a publicidade não deve ser criativa. Sua maliciosa declaração chocou os ouvidos sensíveis do mercado, sendo imediatamente rebatida na midia especializada por Washington Olivetto.

Assumindo o papel de defensor incondicional da criação, Olivetto retrucou com a propriedade que lhe conferem os 44 Leões abatidos em Cannes: "Espero que ele não tenha dito nada disso, mas, se disse, recomendo a todos que não se preocupem, porque é só bobagem. Bobagens, quando ditas em inglês, às vezes parecem coisa séria."

Sem dúvida uma troca de farpas titânicas. De um lado o co-autor de Posicionamento, leitura obrigatória principalmente para gente da criação. Do outro, o vencedor do Gran Clio e autor do Corinthians: é preto no branco, em parceria com Nirlando Beirão.
É claro que todo esse incidente foi apenas devido a uma frase infeliz, que retirada do seu contexto, adquiriu um tom particularmente ofensivo para os publicitários. Possivelmente quando analisada no contexto do discurso de Ries, soasse ainda pior. De qualquer forma, como dizia minha vó, não se pode levar desaforo para casa.
Mas se a declaração é recente, tem agência que vem colocando essa filosofia em prática há décadas. Infelizmente, impérios da indústria da publicidade podem muito bem ser montados em cima de muitas outras coisas além da propaganda criativa.
Não seria irresponsável afirmar que, é mais simples ser bem sucedido no mundo da comunicação produzindo propaganda mediocre. Basta ligar a TV, abrir as revistas ou ouvir o rádio, para confirmar a coerência dessa hipótese.
Porém, se esse é o caso, porque ficar fritando os neurônios na captura das idéias que insistem em esconder-se como um Bin Laden? Talvez porque cada empresa ou cada empresário pense diferente a respeito do que venha a ser sucesso.
No último One Show tem um anúncio da Carmichael Lynch para as guitaras Gibson, que mostra um velho músico, tipo John Lee Hooker, carregando seu instrumento com aquela autêntica majestade típica do blues man. O título é mais ou menos assim: Você pode ficar rico e famoso tocando uma Gibson? Como você definiria rico e famoso?
Por outro lado, é óbvio que trabalha-se por dinheiro: de Ries & Ries Consulting a W/Brasil, a grana é a grande motivadora, a viabilizadora, e sobretudo, a prova irrefutável do sucesso das empressas e das pessoas. O ideal franciscano de viver nesse mundo honestamente e pobre carrega contradições insolúveis para os nossos referênciais de felicidade e realização - para os meus pelo menos.
E uma vez que o lucro é o objetivo comum de todas as empresas, a diferença fundamental entre elas está na forma de ir atrás dele. Em certa medida, isso é determinado pelo modelo de mundo que cada um imagina como ideal para seus planos de negócio e de vida. Acredito que, quarenta e quatro Leões depois, para a justa indignação do Washington, ainda estamos distantes da Terra Prometida.
Não faz mal, essas pequenas ocorrências acabam sendo boas oportunidades para gente pensar um pouco no rumo esquizofrênico que a profissão está tomando. Quem é o mocinho e quem é o bandido? Quando se entra no jogo é sempre bom saber pra que lado chutar.
E do jeito que a coisa anda, não seria de admirar que houve até dono de agência que saiu da insólita palestra achando que finalmente tinha encontrado alguém que pensava como ele. Para o bem do mercado, tomara que transformem suas agências em criativas empresas de RP.
Para finalizar, esse ano, segundo o Estadão, só o Brasil inscreveu 1.197 peças no Cannes Lions. Ao todo o Festival recebeu 16.392 peças de 70 países. Ora, quando a gente confronta esses números com a declaração que deu origem a polêmica, a única conclusão a que se pode chegar é que, vivemos numa época em que existe público para tudo.
É verdade que, esse ano o Festival teve uma queda de 5% no número de inscrições em relação ao ano passado. Essa diminuição, pode ser justificada pela baixa taxa de crescimento da economia dos EUA, pela Guerra do Iraque. Pela estagnação da economia no Japão e na Alemanha ou ainda pelo crescimento medíocre na Europa. Quem sabe? Será que as idéias de Ries fizeram tantos adeptos? Que medo!

"Can you get rich and famous playing a Gibson? How do you define rich and famous?

Abril de 2003

As verbas estão migrando

Toda vez que um dos milhares de especialistas em comunicação discorre sobre alguma novidade que, na sua opinião, significará o futuro da propaganda a abertura é mais ou menos assim: “Já está na hora dos publicitários desencostarem suas barrigas dos balcões dos bares e começarem a se preocupar…” Ou, “já é tempo dos publicitários esquecerem sua gravatas coloridas…” Ou então, “em vez de se preocupar em ganhar prêmios, os publicitários deveriam…”

Tá certo que a classe já teve seu passado boêmio, alguns até já se complicaram por causa da birita. É verdade, também, que ao longo do tempo foram cometidas certas extravagâncias no trajar, fenômeno que teve a sua representação máxima nas gravatas com Mickeys, Pernalongas e outros personagens do universo comics. Da mesma forma, seria muita falsidade negar a absurda obsessão pelo reconhecimento que caracteriza certos coleguinhas.

Entretanto, nada mais distante da realidade do que descrever o publicitário como um palhaço narcisista e beberão. Bem, nem todos. Alguém já viu Júlio Ribeiro a não ser em trajes de cavalheiro? Ou o Roberto Dualibi pedindo a quinta saideira? Mesmo os de outra geração: Marcelo Serpa, Fábio Fernandes, Celso Loduca, Alexandre Gama. Todos bons meninos.

Essa imagem um tanto caricatural do publicitário, talvez tenha origem numa época em que a cultura empresarial era mesmo muito formal e contrastava com a postura mais avançadinha das agências, que recebiam bem os barbudos, os fumantes, os artistas, os comunistas, os corintianos e todo tipo de gente, digamos, diferenciada. Gente que não sabia muito bem o que fazer, mas acabou fazendo muito bem aquilo que não sabia.

No entanto, hoje em dia, enganam-se aqueles que escolhem essa profissão em busca dessa romântica pluralidade. Passado os primeiros sustos, descobre-se que é tão rotineira quanto enrolar brigadeiros. E o seu discurso, original como uma conversa de elevador.

Não vou dizer que não gere uma adrenalinazinha. Por outro lado, pensando bem, não poderia ser muito diferente, uma vez que a propaganda não deixa de ser o “call to action” da ecomonia de escala: um sistema que exige uma correspondência harmônica, padronizada e previsível entre a linha de produção da indústria e o consumidor. Por isso, às vezes, até a competição, por mais acirrada que seja, parece burocratizar-se na monotonia do dia-a-dia recheado de reuniões, relatórios e outras atividades protocolares tão vivas e estimulantes.

E uma vez que a grande maioria das empresas de propaganda não tem conseguido como nos bons tempos, animar a festa do mercado, as disputadíssimas verbas vão migrando para outras alternativas. E as poucas que sobram, migrando para a África de Nizan Guanaes.

É isso aí, enquanto as agências permanecem emaranhadas na teia da prolixidade do seu discurso metodológico, o baiano vai tocando seu rolo compressor, com ar condicionado é verdade, que ninguém é de ferro. Utilizando estratégias superortodoxas, que podem parecer até sem brilho para um publicitário genial. Mas aí que a baianidade em sua encarnação workaholic tem feito diferença.

Atualmente, o talento empresarial, a meu ver, consiste em convencer o empresário antes de tentar convencer o consumidor. E convencê-lo sobre o básico – o que é muito mais complicado: que não existe substituto para a boa e velha propaganda. Ser visto para ser lembrado, parece conselho de tia, mas é assim que sempre funcionou.

Ocorre que nenhum escaldado empresário, em sã consciência, gosta de colocar a mão no bolso, a não ser para uma causa inquestionavelmente lucrativa ou absurdamente supérflua. Por isso, tem sido mais fácil - ou menos difícil - motivar investimentos pelo desconto; pela mídia modesta e tecnicamente bem justificada; na promoção de retorno imediato; no marketing direto de resultado mensurável e em outras panacéias que acabam consumindo o limitado dinheirinho com a promessa de um retorno mais seguro.

Isso não quer dizer essas ferramentas de laboratório não levem a lugar nenhum, mas, certamente, não à glória empresarial e a consagração da marca. Pelo menos no tempo de vida médio dos brasileiros. Muito menos no breve período em que os profissionais de marketing costumam permanecer nas companhias.

Abril 2003

Fogo amigo

Um compasso obstinado e ameaçador abre a cena - Marte, o mensageiro da guerra de Gustav Host - de repente os trompetes, as trompas, os trombones e todos os metais invadem a orquestra como jamantas com seu tema destruidor. A música arde e a atmosfera se inflama. O ritmo marcado, vai produzindo um efeito delirante de redemoinho insano que não admite compaixão em seu percurso direto e brutal.

Muito antes, na África Oriental, há quase dois milhões de anos, onde as provas mais aceitas da nossa evolução se mantiveram, viveram dois tipos de hominídeos. Um, denominado Zinjanthropus, parece ter sido vegetariano. Sua linhagem desapareceu. O outro, o Homo habilis, como Leakey, seu descobridor, o chamou, era carnívoro. E também matador, fabricante de ferramentas e de armas. Dessa linhagem, ao que tudo indica, nós humanos, descendemos.

Bem, que o homem é uma criatura violenta, cruel e cínica, não é nenhuma novidade, nem pede grandes justificativas teóricas. Ao contrário, quanto mais tentamos explicar, mais nos complicamos em evasivas considerações morais, ingênuos cientificismos e outras hipocrisias da época, a propósito, uma característica da espécie.

Do mesmo modo, não é necessário longos recuos históricos para atribuir às guerras praticamente todo o nosso extravagante conforto burguês. Do front às gôndolas é um pulo, parece essa foi a história do fax, do vídeo-fone, de tecidos, enfim, de tudo o que os serviços militares de inteligência julgaram adequado a nós, paisanos.

É assim com todos os produtos que já não representam, militarmente falando, nenhum diferencial competitivo. Ou porque o inimigo também os incorporou ou porque surgiram opções mais avançadas. Por isso, quando deixam de agregar valor à tropa e passam a ser percebidas como ultrapassadas, é hora de dar baixa às patrióticas invenções, com a merecida recomendação à condecoração por bravura.

Em tempos de paz, infelizmente, o mercado só pode contar com a sucata da NASA e da Fórmula 1. É raquete de tênis com não sei o quê da NASA, gasolina com tecnologia da Fórmula 1 e assim em diante. Às vezes, surge uma novidade de algum serviço secreto, mais nem se compara às ofertas da indústria bélica.
Entretanto, a grande novidade dessa guerra, tem vindo das palavras usadas para descrevê-la. Não houve, nem mesmo nas mais poéticas batalhas de todos os tempos, expressão tão ridiculamente guerreira como “fogo amigo”. Parece que o jargão não é novo entre os profissionais, entretanto, só agora foi disponibilizado, pela mídia, para o consumo civil.
Fogo amigo, como tem sido amplamente divulgado, define as situações em que os soldados viram alvo dos próprios companheiros. Mais ou menos como um gol contra, tentando trazer para os nossos referenciais de índole pacífica. E foram necessários apenas dois substantivos para descrever essa realidade inimaginável, do medo adrenalinado misturado à incompetência tática. Como era de se esperar, na hora do pega-prá-capar, vale a lei do antes ele do que eu.

Como figura de linguagem, “fogo amigo” descreve com clareza as situações onde a atitude impensada produz um comportamento contrário à própria intenção, bem como as freqüentes situações em que se é vítima da equivocada boa intenção alheia.

Seu frescor semântico, se é que isso existe, é que “fogo amigo” remete a um cenário contemporâneo. Portanto, sua precisão significativa é a clara associação com fatos de conhecimento geral.

Por exemplo, de agora em diante, podemos dizer que o presidente foi vítima do fogo amigo, por conta das declarações do seu ministro. Da mesma forma, a balança comercial pode ser atingida pelo fogo amigo da política monetária.
Assim, toda vez que aquilo que deveria ser cooperação transformar-se numa trapalhada, a expressão vai cair bem para descrevê-la. Ou seja, quase sempre.

Como toda novidade da cultura de massa, pelo excesso de uso, pode ser que acabe tornando–se vítima do fogo amigo do seu próprio sucesso.

No plano do comportamento humano, fica evidente que “fogo amigo” é mais que adequado para simbolizar todas as inexplicáveis atitudes contra si mesmo. Nesse sentido, é a própria metáfora da guerra.




Para ler: Capítulo lX - Mitologias De Guerra e de Paz em: Para Viver os Mitos de Joseph Campbell - Editora Cultrix, 1997

Para ouvir: Gustav Holst – The Planets, Op. 32 – Saint Louis Symphony Orchestra – Walter Susskind, Regente – MMG, 1975

Março de 2003

Déjà vu

“Dois industriais se encontram. O primeiro pergunta ao segundo: Sua publicidade é eficaz?
Sem dúvida alguma - responde este – Por exemplo: outro dia colocamos um pequeno anúncio para encontrar um vigia noturno e, na mesma noite, fomos assaltados.

De maneira simplesmente caricatural, esta história ilustra bastante bem os resultados de alguns trabalhos recentes; nem sempre a publicidade produz os efeitos esperados. Em compensação, ela produz outros que, por vezes, os próprios anunciantes não esperavam”.

Apesar da atualidade da piada, o trecho acima abre um livrinho meio antigo mas interessante: Os Mitos da Publicidade publicado no Brasil em 74 pela Vozes. O livro parece ser uma seleção de ensaios da revista “Communications”, pelo menos é isso que se deduz do subtítulo da capa.

Nos anos 70 comunicação virou um pouco moda e de repente começaram a pipocar livros de assuntos como semiótica, linguística, mitologias, assuntos não muito fáceis de entender mas obrigatórios de se carregar para estar - usando uma expressão da época: inserido no contexto. Os novos cursos de comunicação tinham enfim a cara pop para atrair uma geração a procura de, perdoem o trocadilho, “significado”.

Mas vejam só, nesse outro trecho, como mesmo há 30 anos a validade do investimento em propaganda já era maldosamente questionado: “Talvez não exista nenhum outro ramo dos negócios que apresente tão poucas justificações do emprego dos recursos que lhe concedemos”, a declaracão é de 1969 e foi feita pelo vice-presidente da Coca-Cola no Estados Unidos, McNiven.

Em outro capítulo nos deparamos com um parágrafo que bem poderia ter chegado através de um e-news agorinha: “Se observamos o que se passa no estrangeiro, mas também entre nós, há alguns anos, a publicidade direta parece, de forma evidente destinada a um futuro mais brilhante que o da publicidade geral. Cada vez mais os clientes (Industriais, comerciais, vendedores de produtos ou serviços) exigirão resultados palpáveis para orçamentos de publicidade cada vez mais elevados. Ora, precisamente nos Estados Unidos, as grandes agências estão em crise. Os orçamentos de publicidade orientam-se, cada vez mais para fornecedores rentáveis, cuja remuneração se faz por honorários e não através de comissão (certos orçamentos comportam 35 de honorários, outros 18%)”.

Incrível é quase três décadas depois pouco ter mudado nessa paisagem: o marketing direto continua com seu futuro cor-de-rosa enquanto as agências de propaganda agonizam impotentes em seus leitos de morte. Morte lenta, por sinal.

É evidente que muita água passou por baixo da ponte deste os anos setenta. O mercado é hoje muito melhor compreendido do que há 30 anos. Tudo modernizou-se fantasticamente, mas principamente cresceu a demanda por informação, viabilizada pela tecnologia e estimulada, obviamente, pela natureza competitiva do mercado.

No entanto, paradoxalmente, mesmo com um retrato muito mais nítido e detalhado à disposição, ainda assim, com freqüência, assistimos à recorrentes aberrações estratégicas. Como numa tragédia grega, os oráculos são também inexplicavelmente ignorados ou mal interpretados. O final todos conhecem.
Filosofando um pouco, se me permitem a pretenção, parece-me que além do alívio e da purgação, as tragédias pretendiam proporcionar também alguma aprendizagem, do mesmo modo deveria ocorrer com a história, para não tornar-se um insosso déjà vu.

Por isso, nesse século onde tudo parece tão novo e inédito, parece oportuno, pra encerrar, incluir um sarcástico parágrafo do começo da moderna era publicitária, escrito em 1959 por um tal de Martineau, numa obra citada no velho livrinho.

“Em nossos dias, nenhum industrial procederia para fabricar seus produtos, da mesma maneira como alguns deles elaboram suas estratégias comerciais e publicitárias. Ele não misturaria jamais um pouco de óleo, de álcool, de doce de framboesa e alguns pregos, esperando que daí surgisse alguma coisa.”

Fevereiro de 2003

Foco, foco, foco

Palavras, palavras, palavras. Certamente é Shakespeare. Hamlet ou Macbeth? Não importa, se não é de uma, é da outra. O mesmo acontece com as sinfonias de Bethoveen: quando não é a Quinta, é a Nona. O trágico, entretanto, é que há algo de podre no reino da comunicação.
Nossa memória auditiva ainda guarda fresca a fase do “a nível de”, pronunciado até a exaustão pelos tecnocratas dos anos noventa e outros enganadores que pretendiam parecer-se tão sabidos quanto.
Deram-se mal, quando os guardiões da língua começaram ocupar espaço na mídia, alertando o competitivo vestibulando e o incauto cidadão que já começava a incorporar o estilo à sua pobre dieta vocabular diária. Hoje, tudo indica que o seu emprego mantém-se em índices endêmicos em alguns círculos, entre os quais, infelizmente, o nosso.
Depois disso, sobrevivemos ao bombardeio implacável das referências à globalização e ao terceiro milênio, que justificaram desde planejamentos de marketing até convocações para a Seleção. Assim, o novo século e a nova ordem econômica foram introdução e conclusão de nove e meio entre dez textos produzidos nos últimos anos.
Eis que entramos convalescentes no século XXI, e, mais uma vez, o fragilizado idioma é contaminado por uma palavra aparentemente inofensiva . Benígna em sua origem: focar, segundo os dicionários, queria dizer – até o século passado - formar uma imagem nítida ou ajustar um sistema óptico para que mostrasse imagens dessa forma. Em sentido figurado, significava fazer voltar a atenção, salientar, evidenciar. Já como substantivo, podia corresponder a centro, ponto, local, além do clássico conceito de ótica.
Tudo deve ter começado, imagino, em pequenas culturas inoculadas nas vísceras inflamadas das corporações. Durante algum tempo, sob a temperatura amena do ar-condicionado, circunscrita aos PowerPoints e ao ambiente asséptico das salas de reuniões, permaneceu inofenciva quanto a sua capacidade infecciosa. Começou então a ser difundida nos seminários e rapidamente disseminada pela irresistível tendência humana de incluir ao seu vocabulário qualquer palavra que distinga quem a pronuncie. Reproduzida nas águas estagnadas da literatura corporativa, ganhou escala e dimensão epidêmica. Digitada com generosidade inconsequente por redatores do jornalismo mal remunerado, conquistou as bancas. Foi assim, meio sem perceber, que contraímos mais essa: a febre do foco.
O delírio é inevitável: tudo é focado. Inconcebível um planejamento sem foco, uma empresa pode abrir mão de tudo, menos do seu foco. Foco no mercado, foco no cliente, foco no futuro. Tanto, que o desafio do novo Governo é focar as grandes questões nacionais.
Colaboradores focados, organizações focadas. A pessoa focada na sua integridade.
Focar as competências a empregabilidade. Foco na carreira.
Foco na marca, nas vendas, no valor para o cliente.
Na comunidade, na qualidade de vida. Foco no social
Foco no meio ambiente. Empresas responsáveis: focadas no cidadão
Vivemos uma síndrome multifocal, uma autêntica era Varilux.
Nessa progressão de significados, em breve, ao assistirmos nosso futebolzinho pela TV, vamos ouvir, em som direto, a voz esganiçada do treinador na beira do campo: “Foca! Foca! Cada um foca o seu! Cada um foca o seu! ”
Voltando ao princípio, Hamlet ou Macbeht?
Embora essa fosse a questão, acabo descobrindo um pouco mais na internet, num artigo assinado por S. S. Moorty.
Diz o texto, que “os verdadeiros amantes do teatro Shakespeariano, assistem e lêem suas peças não apenas pelas histórias emocionantes ou pelas tramas complicadas. A linguagem de Shakespeare é, em primeiro lugar, uma fonte vital para o nosso prazer”, afirma o autor.
E ao contrário do que supõe nossa vã filosofia, sua linguagem não deveria ser um obstáculo para a apreciação. Ainda que de difícil compreensão, o poder do discurso Shakespeariano está justamente no seu vocabulário, “espantosamente rico”, com cerca de 29.000 palavras.
Então Polonius pergunta: "What do you read, my lord?” Hamlet indiferente responde: "Words, words, words". Essa passagem, segundo o artigo, “sintetiza todo fascínio dos teatrólogos com o aspecto dinâmico da língua inglesa” a qual Shakespeare adicionou milhares de palavras e deu significados novos às palavras conhecidas.
Muitas palavras Shakspeareanas "seriam estranhas à platéia porque eram produtos de sua invenção ou foram usadas uma única vez.”
Então Moorty conclui: “Em Shakespeare o vocabulário recebeu mais atenção que qualquer outro aspecto da língua. Talvez porque seja esse o seu elemento mais simples e acessível. De qualquer forma, sua línguagem será sempre cativante e desafiadora.”
Fico imaginando: é tudo uma questão de foco.


Para quem quiser ler o artigo completo: http://www.bard.org/SectionEducate/WordsWords.html’




Janeiro de 2003

Crises, crises

Dizem os consultores e otimistas em geral que nelas escondem-se as oportunidades. Vá esconder bem assim lá no inferno! Por outro lado, se assumirmos isso como verdadeiro, devemos então estar vivendo na era e na terra das oportunidades.

Não faz muito tempo - mais uma vez - as agências começaram a demitir ou ajustar-se, se me permitem o eufemismo. Que a notícia não é nova eu sei. Entretanto, não sinto desatualidade em comentá-la somente agora, até porque essa história é muito mais velha do que vocês imaginam.

Desde quando me lembro, a nossa atividade encontra-se em crise. Os motivos variaram conforme as conjunturas da época e já o foram quase tudo que se possa imaginar: empobrecimento da classe média, planos econômicos, custos dos veículos, sei lá o que mais.

É sempre igual, um belo dia entra alguém na criação e comenta: "Cês viram? A Thompson demitiu não sei quantos" - geralmente é um número maior que a totalidade dos funcionários da agência. Porém o mensageiro não merece censura, notícia ruim tem que ser dada com certo exagero, senão neguinho nem se dá conta, tal é a quantidade de más notícias diárias. Na semana seguinte de novo entra o urubu e larga: "Cês viram? A Olgilvy..."

Se, num espaço de dois ou três meses, recebermos semanalmente a visita do agourento colega, esse não é o melhor momento para discutirmos aquele ajuste de grana que ficou para ser conversado depois. Esteja certo, a crise mais uma vez chegou, com a mesma regularidade da primavera européia ou das inundações paulistanas.

Mas, para não ficarmos apenas brincando com essas coisas tão sérias, vejam alguns dados dessa edição da crise: segundo o Sindicato dos Publicitários do Estado de São Paulo, foram homologadas, só em agosto deste ano, 225 demissões, contra 39, do mesmo período, do ano passado. Se considerarmos que apenas funcionários com mais de um ano de casa estão obrigados a homologar suas demissões no sindicado, é claro que esse número é muito maior.

"Mais de mil", diria nosso amigo. Muito mais, eu acrescentaria. Se imaginarmos que grande parte das agências têm relações trabalhistas que não podem ser computadas por esse levantamento, como pessoal não registrado e outras informalidades incompatíveis com a ética que a modernidade corporativa requer.

Não sei por que, de repente, tive a lembrança de meu avô conversando com tios e outros quatrocentões falidos sobre a crise de 1929. Bons tempos aqueles, quando a catástrofe podia ser localizada num espaço de tempo tão claramente definido. Mais recentemente, para não ter que ficar batizando cada crise, como fazemos as gripes, aprendemos a agrupá-las em décadas. Assim, os anos oitenta passaram a ser a "década perdida", ressaca e conseqüência dos tempos do "milagre" e da crise do petróleo, que foram duas se não me engano, no começo e no fim da década de 70. E é claro, do endividamento que no início dos anos 80 nos obrigou a fazer feio dando o calote: crise econômica sim, mas, inegavelmente, moral também.

E de crise em crise, foram surgindo as novas agências que cresceram, cresceram para então integrarem a crise atual - evidentemente, apenas as que sobreviveram a crise passada. Muitas alegremente idealizadas em pubs pelos próprios desempregados, vítimas da crise, e algumas parcialmente financiadas pelas próprias indenizações trabalhistas - muito bem-vindas num momento de crise.

Assim tem sido. Para o bem ou para o mal, é a forma do mercado regular-se, manter-se e, é claro, ganhar dinheiro. Entretanto, desemprego é sempre chato, quase sempre injusto e não combina nada com o estilo de vida que a propaganda prega e emprega.

Por isso, incomoda um pouco mais, a cada repetição desse melancólico ciclo, ouvir comentários cheios de ressentimentos classistas, paranóias burguesas e justificativas corporativistas. Como se pertencêssemos a uma classe de proletários excluídos como estivadores poloneses ou carteiros russos. Quando somos, isto sim, apenas mais ingênuos.

Naturalmente, em reação a essa recorrente conjuntura, surgirão idéias novas, saídas espertas, registradas nas atas solenes dos dirigentes, bem como nos guardanapos e em outros suportes menos convencionais do pessoal mais revolucionário.

Quem sabe que oportunidades escondem-se nesse quadro filtrado pelo blur traiçoeiro da crise? Que segmento surgirá como salvador do mercado? De onde virão as verbas redentoras?

Por enquanto, é tentar dormir bem, se alimentar direito, essas coisas que a gente, às vezes, esquece.

Dezembro de 2002

E por falar em pousadas

E por falar em saudade, como cantou Vinícius, onde andam as idéias que transformavam anúncios em notícias?
Ultimamente, o novo tem sido o mesmo todo dia: requentado em bureaus digitais ou em banho-maria pelos santos da casa. O gosto não é de todo mal, mas, como empadinha no micro-ondas, meio insosso.

Folheando a Caras ou a Veja, é difícil não ficar nostágico a ponto de achar que no tempo da Manchete e da Realidade é que era legal. Por mais inocentes que os anúncios daquela época fossem, trasmitiam um sincero compromisso com um consumo menos disfarçado e elegante. E os melhores eram muito bonitos.
E por falar em beleza, onde andam aqueles outdoors da Magy e as campanhas imortais do Petit para a Souza Cruz?

Há alguns anos o Romeu da Rio Books, apareceu com uma oferta dos Anuários do Clube de Criação: toda a coleção por um precinho camarada. A Giovana interessou-se mas achou um pouco salgado. Então, me lembro, até meio envergonhado pela canalhisse, fiz a proposta: "Se você topar a gente meia, eu fico com os mais antigos e você com os novos". Até hoje ela deve achar que fez um bom negócio, e talvez tenha feito mesmo.

É, essa é uma profissão estranha, cheia de gente estranha e interessante, movida por ambições que não são ambições comuns, embora não as exclua. Pessoas adolescentemente apaixonadas pelo fazem. Perdidamente obcecadas por vírgulas e outros detalhes que não fazem a menor diferença para quem não é do ramo.

E por falar em paixão, em razão de viver, é curioso constatar como a propaganda é um cacoete, uma especie de vício. Não tão sublime como o álcool ou cool como as drogas. Está mais para uma espécie de roer unhas ou outra prática do tipo, sem nenhuma grandeza patologica que justifique internação ou camisa de força.

Até pouco mais de dez anos, poderia se formular uma hipótese de dependência química, baseada na presença da cola de sapateiro nos departamentos de arte das agências. Para quem não sabe, as artes finais eram montadas com essa cheirosa matéria prima, gosmenta e tóxica, assim como os layouts e tudo o mais.

De qualquer forma, como todo vício, se a sua prática não é capaz de garantir a felicidade, a abstinência nos faz muito tristes.
E não falta nem mesmo aquele ingrediente de culpa fundamental a um comportamento dependente, pois freqüentemente a propaganda é acussada de gerar uma sociedade anciosa, competitiva e violenta. Como se a atividade fosse o mal em si e não ela própria reflexo dessa sociedade doidinha.
Por outro lado, o publidependente - acho que podemos chamá-lo assim – ama e remega o seu vício. Nos seus raros momentos de lucidez durante aquela parada entre Natal e Ano Novo, numa praia encantada, encantado por todos os encantos e protegido do cancer por bloqueador solar, sonha em deixar aquela vida e abrir uma pousada.

O exercício é mole para a mente acostumada a matar jobs e decifrar briefings sob a impiedosa pressão dos prazos. Sim, saberia como fazer.
Como num bom anúncio a graça do lugar estará na simplicidade, só o necessário. Uns cinco ou seis chalézinhos para começar, dependendo do terreno, a cento e poucos paus a diária, com café da manhã.
Agora é só pedir as contas. Antes fosse. No fundo, o projeto libertador da pousada não passa de mais um job fantasma, feito à beira mar sob a supervisão dos siris atentos nas bordas dos seus buracos.

Mesmo assim, a cada merecida pausa a gente passa a lidar melhor com as contradições da profissão, justamente porque se afasta um pouco dela. Conseguimos enxergar melhor como participamos dos seus processos nervosos. Podemos analisar nossa dimensão real longe das ventoinhas dos computadores, dos objetivos irrealizáveis e das pressões inexplicáveis das agências. Então, livre desses véus cotidianos a mente criativa novamente assume o controle, aos poucos, outra vez, tornamo-nos conscientes do poder. Mas ainda resta o mais difícil: fazer serenamente as pazes com o nosso talento que é, em última análise, o nosso valor de mercado.
Estamos prontos. Acabamos de entrar no limite crítico. E embora nosso vício tenha cura, nem todos queremos ser curados.

Feliz temporada a todos.


Dezembro de 2002

Se é bonito voa bem

Verão de 1955. Já em seu début, na iluminada atmosfera francesa ele demonstra graça e firmeza. Um ano e alguns meses depois, após muitas correções e ensaios, acontece l'avant- première. Lançado ao céu livre da Europa por 4.500kg de empuxo, o espetáculo inicial é conduzido por um motor SNECMA Atar 101G - francês evidentemente -, em 18 de novembro de 1956.

"Será como uma visão no deserto: o inimigo o verá, mas jamais o tocará", explicou então Monsieur Dassault, seu idealizador, justificando o nome poético escolhido para batizar o projeto: Mirage.

Depois disso, a história é bem conhecida: o Mirage tornou-se a fantástica aeronave que levou a França a se igualar aos Estados Unidos em tecnologia e desempenho na aviação militar. Uma virada incrível no tabuleiro do pós-guerra, considerando-se que depois da Segunda Guerra Mundial a Força Aérea Francesa só operava com aviões de combate estrangeiros.

Os especialistas apontam, a Guerra da Indochina - entre as décadas de quarenta e cinquenta - como a razão que levou o governo francês a voltar sua atenção à reconstrução da indústria aeronáutica, uma vez que a nação dependia totalmente dos seus aliados, principalmente dos Estados Unidos. Entretanto, é razoável supor que a simples dependência da América possa ter sido mais do que suficiente para motivar os orgulhosos franceses.

Reforçando essa hipótese, não seria por acaso que o parceiro do governo francês, para essa empreitada, fosse Marcel Dassault. Nascido em 22 de janeiro de 1892, foi um dos pioneiros da aviação do começo do século XX. Engenheiro e construtor de aeronaves, atuou nas duas Grande Guerras. Foi capturado pela Gestapo em 44 e quase não sobrevive ao campo de Buchenwald. Com o fim do conflito retornou suas atividades assumindo como sobrenome a sua identidade-código da Resistência: Dassault. Seu nome original era Marcel Bloch. Além disso, Dassault foi senador e deputado, editor e produtor de cinema. Morreu aos 94 anos em 1986.

Como se essa biografia não fosse suficiente para marcar sua passagem por essa existência, coube ainda a Dassault uma frase definitiva sobre a eficiência aerodinâmica. Disse ele uma vez: "Avião bonito voa bem".

Quantas teorias e conceitos, das mais diversas escolas, permaneceriam válidos depois de confrontados com assustadora simplicidade dessa frase? Se partisse de um poeta, vá lá. Se fosse referente a um tipo de design de vanguarda, certamente geraria discussões, talvez até inagurasse uma tendência, quem sabe virasse um slogan, justificasse uma moda, sei lá.

Contudo, aplicado à performance de um avião, a frase ganha um significado muito prático e mensurável. Formulada pelo engenheiro francês, herói da resitência, fabricante de um dos mais fantásticos caças supersônicos de todos os tempos, adquire pelo menos a posição de teoria consistente. E fez tanto sucesso como suas magníficas aeronaves.

Lamentavelmente, a máxima de Dassault, ao contrário do Mirage, nasceu facilmente capturável pelo inimigo. Mesmo nos dias de hoje, ainda pode ser encontrada em cativeiro nos folders de consultores de segunda ou confinada em PowerPoints pretenciosos. Usada para o bem, já esteve num book de apresentação da DPZ lá por oitenta e pouco. Tinha tudo a ver com a agência naquela época, e tem tudo a ver com a atividade da propaganda até hoje.

É verdade que anúncios bonitos (não bonitinhos) estão meio em baixa hoje em dia. Mas a história da propaganda tem demonstrado que ainda são os que voam melhor. Conseguem atingir os objetivos com mais precisão e causam maiores danos ao inimigo.

Mesmo assim, a cada dia têm-se a sensação de que o mercado abandonou essa tese há muito. Emaranhando-se num cipoal mercadológico-burocrático, intransponível para quem ousa, mas muito confortável para quem aceita. Talvez essa seja a explicação.
Nessa entediante configuração, para desespero da nossa natureza competitiva, tudo se equivale, joga-se pelo empate, todos perdem.

C’est la vie, como diriam os franceses.


Setembro de 2002

Aspirina ética

ASPIRINA ÉTICA

Não sei se por sorte ou azar, nunca participei de nenhuma campanha eleitoral durante meu tempo de propaganda. Guardo isso com um misto de orgulho e frustração de solteirona, que venera e amaldiçoa a virgindade preservada.
O mais próximo que estive da disputa eleitoral foi um free para a Expressão, encomendado ou oferecido, quem sabe, ao então prefeito de São Paulo, Mário Covas que, na época, pretendia concorrer a reeleição da capital paulista.
Quis menos o destino e mais a conjuntura, que o projeto do finado político santista desandasse por conta das manobras do Congresso, que impediu a reeleição de prefeitos - não me recordo se apenas das capitais ou da totalidade dos municípios, não importa. O fato é que a canditatura não saiu e o meu trabalho se resumiu àquele job. Não posso reclamar, o dinheiro veio em boa hora, como sempre e, pontualmente, o que nem sempre acontece.

Nessa ocasião, surpreendendo a política paulistana e estarrecendo as pessoas sensatas, elegeu-se o sinistro Jânio Quadros. A propósito, nessa eleição o Professor Maluquinho, deu um histórico cacete no Menino de Sorbone, que anos mais tarde, partindo para a forra, se tornaria o nosso acadêmico estadista, mentor do Real e do imaginário.

Lembro-me, na época, que o pessoal do já ganhou de Fernando Henrique, ficou com cara de bunda por mais de uma semana. Virada semelhante foi reprisada no mandato seguinte, na disputa entre Maluf e Erundina, que decidiu-se nas 24 horas anteriores à eleição. Com a diferença que o pessoal do Maluf, mais acostumado ao gosto amargo da derrota, ficou com a cara de sempre.

Mas, se a vida um dia colocar esse tipo de missão no meu caminho, espero que exista alguma afinidade ideológica, que não seja só pelo dinheiro. Não por rigor ético, mas porque deve ser mais produtivo.

Por natureza, não sei se possuo o profissionalismo extremado dos chamados marqueteiros políticos, capazes de atender sem distinção à direita e à esquerda, se é que essa divisão diz alguma coisa hoje em dia. Pra mim, a preferência política tem muito de afetividade, de identificação subjetiva, seja para a aprovação ou rejeição. É meio como torcer por time, embora o sofrimento possa ser bem maior. Quer dizer, depende do time ou do canditado.

Uma vez a questão me foi colocada da seguinte forma, por um profissional que na época tinha seu soldo pago por um canditato a Deputado Federal: se em vez de publicitários fôssemos médicos, receberíamos da mesma forma aos Lulas, Garotinhos, Serras ou Ciros. Se advogados, da mesma forma, todos seriam atendidos, talvez de alguns fosse exigido pagamento antecipado, mas a diferenciação não iria muito além.
Aos que estão trabalhando na comunicação para as próximas eleições recomendo, se preciso, recorrer a essa simplificação como uma aspirina ética. Não posso receitá-la cegamente, mas acho que funciona.
Se os sintomas persistirem, procurem um outro candidato.

Julho de 2002

Ela pensa que toco piano num bordel

Tenho guardado comigo uma edição recente de Veja que chamei de histórica, por conter, na minha opinião, os piores anúncios já feitos e assinados pelas melhores agências de propaganda do país. A observação sobre as agências é importante para registrar que não se trata simplesmente de anúncios ruins, presença obrigatória na midia de todos os tempos - até porque os bons, só o são se comparados com maioria meia-boca. Assim é que tem ser.

Até aí tudo certo, não faz tanto tempo que propaganda passou a refletir toda essa glamurosa dignidade, a incorporar esse ar inteligente e a assumir-se como manifestação máxima do talento humano em todo seu esplendor. A clássica afirmação de um publicitário das antigas: "Não digam à minha mãe que estou trabalhando numa agência de propaganda, ela pensa que toco piano num bordel em Paris". Parece representar bem a autopercepção que se tinha da profissão, num passado mais ou menos próximo.

Antes um pouquinho, desse passado mais ou menos próximo, vejam que interessante: a pioneira Escola Superior de Propaganda e Marketing surgia como um departamento do MASP e nem tinha a palavra marketing incorporada ao nome. Sua criação foi idéia de Pietro Maria Bardi, então diretor do museu, que tinha o sonho de montar uma escola de “arte publicitária” - seja lá o que ele imaginava fosse isso. Estamos em 1951, no início, havia apenas um curso livre de propaganda.. "Com o passar dos anos, segundo a escola, acompanhando a evolução do mercado, o curso incorporou o marketing, transformando-se finalmente em uma escola de nível superior, a partir de 1971". A partir de então nossa atividade nunca mais foi a mesma.

De um lado, o marketing começou a fazer parte da nossa vida, da parte chata. E de outro, o ensino formal conferiu à propaganda a decência necessária para atrair as filhas e filhos da classe média (burguesia, para a militância), com sua necessidade inexplicável, embora compreessível, de diplomas. Mas, ainda que cheio de contradições, o resultado desse nosso processo têm sido bom, pelo menos no que diz respeito à qualidade criativa, os resultados de Cannes desse e de outros anos estão aí para mostrar.

Mas voltando a Veja, minha paranóia é que os mais afoitos comecem a fazer o seguinte raciocínio: se a agência que assina esse anúncio é boa, logo, esse anúncio - embora pavoroso - também é. Pensando bem, azar deles. Acho que toda pessoa tem que ter a manha de julgar sem se alterar pela inveja, nem pasmar-se diante da fama. Se não for assim, não faz sentido.

Por outro lado, sabemos que os anúncios tem mais ou menos a mesma história: um briefing, um prazo e um preço. Os perigos moram nas variáveis que envolvem cada um desses estágios. Inclua-se aí os níveis de aprovação, os critérios de julgamento as aspirações de resultado, as limitações de tempo e dinheiro. Bem como as pesquisas, as ansiedades, as objetividades, os preconceitos e as desculpas,. Não menos importantes são, os exercícios de poder, as inseguranças disfarçadas, as omissões estratégicas e as ausências planejadas. Dessa ebulição caótica devem sobreviver intactos: títulos, cromos, textos e artes, tudo perfeito. Só então, fornecedores abnegados materializarão o anúncio, encaminhado-o para os veículos, no mínimo tolerantes, pois a essa altura o prazo já era. Na maioria das vezes dá certo.

Só não dá quando: alguém não quer, não permite, não entende ou não se importa.
Tomara a tendência seja passageira, tomara não seja tendência, apenas um tropicão, um acidente em um número editorialmente sem grande importância. Tomara eu esteja equivocado ou apenas com inveja.

Junho de 2002
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